As idas e vindas do judiciário em Alagoas contra os credores de Collor

Juiz que concedeu penhora de cotas volta atrás e dá mais prazo para advogados de empresas negociarem – após seis anos
Sede das empresas e administrador judicial, nomeado pelo juiz do processo em que Organização Arnon de Mello tenta evitar a falência: há seis anos empresas de Collor retardam pagamento a credores trabalhistas – em boa parte pela condescendência de órgãos que deveriam fiscalizar cumprimento da lei, papel de José Luís Lindoso. (Foto: reprodução)

Nesta quarta-feira (12), o Tribunal de Justiça de Alagoas deverá julgar recurso movido pelos credores trabalhistas de Collor pedindo, entre outros pontos, a anulação de rodadas de mediação em que as empresas ofereceram valores com percentuais considerados abusivos de deságio.

Também nesta quarta se encerraria prazo para advogados do grupo de comunicação Organização Arnon de Mello (OAM) apresentassem proposta formal de pagamento a um dos credores: o que obteve, na Justiça do Trabalho, a penhora das cotas sociais de Collor – tornando-se, na prática, o controlador do grupo de comunicação.

Collor detém cotas que, se convertidas em dinheiro, valem cerca de R$ 422 mil; o credor tem direito a R$ 371 mil, pelos cerca de vinte anos de trabalho numa das empresas, em atividades técnicas ligadas às transmissões televisivas.

O pedido feito pelos advogados das empresas vem nada menos de seis anos após o início de um processo marcado por estratégia, segundo os credores, baseada em apostar no esgotamento emocional e financeiro para pagar o que querem – e não o que devem.

E curiosamente, após a decisão apontada pela maioria como honrosa à missão da Justiça do Trabalho (ao penhorar as cotas sociais), o juiz do caso concedeu o prazo pedido pelos advogados das empresas.

Ou seja: deu um passo à frente, reconhecendo o direito do credor – e dois atrás, ao conceder um prazo sem outra razão senão retardar a execução desse direito.

Também da Justiça do Trabalho vem uma decisão que só não chegou a surpreender, desencorajar ou abater os credores trabalhistas porque o segmento, como citam alguns dos ouvidos pelo blog, já se acostumou aos ardis e manobras adotadas pelas empresas e corroboradas pela justiça, como a proposta de pagar R$ 12,5 mil a todos eles, independentemente do tempo de serviço que tivessem de empresa.

O montante representa menos de 10% dos valores a que muitos tinham direito, conforme a função e o tempo de trabalho.

Há pelo menos uma semana, outro credor identificou um dos veículos que, supostamente, se encontraria em Maceió: uma SUV Toyota modelo Hilux ano 2013, avaliada em pouco menos de R$ 100 mil.

A juíza expediu mandado de penhora, a defesa dos credores passou a acompanhar a movimentação para estar presente às diligências do oficial de Justiça que faria avaliação do veículo.

Caso não fosse localizado, o despiste configuraria o que a lei denomina litigância de má-fé e ato atentatório à dignidade da Justiça.

O primeiro seria algo como acionar o Judiciário com fins não legítimos, como apenas retardar ou conturbar um processo e o segundo, algo como desrespeitá-lo; cabendo multa de 20% revertida em favor do credor e do mesmo percentual, revertida à Justiça Trabalhista, respectivamente.

A propósito de atos atentatórios à Justiça, advogados das empresas de Collor procuraram a defesa do credor que obteve o ganho de causa no pedido de penhora das cotas da Organização Arnon de Mello (OAM).

O contato foi feito após a decisão da Justiça do Trabalho da semana passada, que repercutiu nacionalmente.

O pedido era para uma rodada de negociação com esse credor e com mais dois, que também têm processos em estágios adiantados de tramitação – e, igualmente, podem levar a Justiça (se houver mesmo disposição) a adotar medidas como outras penhoras e bloqueios.

A defesa do credor comunicou o caso ao juiz e obteve a decisão de que, se houvesse mesmo interesse de fazer uma proposta concreta, que esta fosse protocolada pelos advogados das empresas em caráter oficial, no processo – e no prazo de cinco dias.

Se não houvesse proposta ou não trouxesse nada de concreto, a manobra poderia, a exemplo do outro caso, se configurar em ato atentatório à dignidade da Justiça – e, novamente, passível de multa.

O blog apurou que houve, da parte dos credores, o sentimento de que a oferta seria, na prática, mais uma estratégia para ganhar tempo ou propor condições bem desfavoráveis, como deságios elevados e o que restasse, dissolvido em muitas parcelas.

O prazo dado pela Justiça para que os advogados das empresas fizessem essa proposta expiraria nesta quarta-feira (12).

Antes, porém, os advogados das empresas pediram ao juiz do processo mais dez dias – e o juiz concedeu.

A concepção, agora, é: o que mudaria – supostamente para melhor – na proposta com mais dez dias que não foi oferecido em seis anos, e só depois que o credor obteve a penhora das cotas sociais?

No entanto, em vez de considerar o pedido uma manobra ou ardil, e se sentir aviltada, a Justiça concedeu a prorrogação do prazo.

Cadê o carro

A localização da SUV teve também passagens que afrontam o bom senso.

Antes de autorizar a diligência de campo, para que o oficial de Justiça tentasse identificar e avaliar o veículo, a Vara Judicial mandou que Collor fosse comunicado.

Além de esdrúxula, a medida que não está prevista em lei, acabou retardando a localização do veículo, uma vez que, como o blog também mostrou, há meses Collor não é localizado em Maceió, Brasília ou São Paulo.

Na prática, nada de carro, nada de penhora.

Recursos de credores

Um dos pontos questionados no recurso dos credores, previsto para ser julgado pela Terceira Câmara Cível, nesta quarta-feira (12), nas operações denominadas mediação, segundo eles, é que o termo seria mediação apenas no nome, uma vez que não havia a figura crucial para tal procedimento: um mediador.

Havia apenas representantes do administrador judicial e a apresentação de um valor.

A lei estabelece que o administrador judicial não pode exercer as duas funções e parecer do Ministério Público de Alagoas já questionou a atuação do administrador José Luís Lindoso, recomendou seu afastamento e abertura de inquérito policial para apurar indícios de crimes contra a Lei de Falências.

Uma das irregularidades atribuídas a Lindoso é não ter questionado os repasses de R$ 6 milhões das empresas aos sócios, já durante a recuperação judicial; o que é ilegal.

Collor era o sócio majoritário na época, os empréstimos foram feitos sob o regime de mútuo (sem passar por instituições financeiras) e, segundo a denúncia, se caracterizariam em esvaziamento patrimonial.

As investigações pelo inquérito policial já começaram e Lindoso deverá ser ouvido.

O recurso a ser julgado nesta quarta-feira, denominado de agravo, é uma das movimentações em mais de um ramo do judiciário em que os credores buscam o que lhes é de direito.

Este tramita na Justiça comum, responsável pelo processo em que as empresas de Collor dizem tentar evitar a falência, a recuperação judicial.

Mas, que este espaço apontou por mais de uma vez – e os indícios que se acumulam vão só reforçando – se constituiria numa manobra para dar um calote nos ex-empregados.

É pela recuperação judicial, também, que corre o processo em que a Rede Globo tenta se desvincular da figura de Collor.

Sob o argumento mais que legítimo de lhe causar “grave dano reputacional”, como citou num recurso, a emissora carioca procurou desfazer a sociedade com uma das empresas de Collor, que retransmite seu sinal em Alagoas.

No entanto, o procedimento mais do que comum em qualquer sociedade foi tolhido pela Justiça de Alagoas.

Inicialmente, em primeiro grau, na liminar concedida pelo juiz Leo Denisson de Almeida, em dezembro de 2023, titular da 10ª Vara Cível da Comarca de Maceió.

Atendendo pedido de advogados das empresas de Collor, o juiz determinou que a sociedade fosse mantida sob o argumento de que, caso desfeita, as empresas iriam à falência e não pagariam as dívidas assumidas na recuperação judicial.

Alegação que soa contraditória quando as empresas pagam R$ 67 mil de salário ao administrador Luís Amorim, como demonstra documento no recurso movido pela Globo contra decisão da mesma Câmara Cível de junho do ano passado.

Recurso da Globo

Na última segunda-feira (10), a Rede Globo protocolou um dos recursos para desfazer a sociedade com uma das empresas do grupo: o agravo em recurso especial.

Depois que a Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça, então sob a presidência de Fábio Bittencourt – hoje presidente do TJ –, decidiu manter a sociedade à força, a emissora carioca recorreu.

Entrou com recursos para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), por entender que a decisão contrariava leis federais, e para o Supremo Tribunal Federal (STF), por considerar que haveria, também, violações à Constituição Federal.

Porém, esses recursos são protocolados no tribunal estadual, para, só então – no jargão jurídico – “subirem” para os tribunais superiores.

No entanto, após o fim do prazo, que expirou à meia-noite da segunda-feira, apenas o recurso para o STJ havia sido protocolado, como a reportagem apurou.

Na prática, a emissora carioca só teria encaminhado recurso para o STJ.

O blog procurou ouvir o administrador judicial, em reportagem anterior, bem como o Tribunal de Justiça e o administrador das empresas.

O administrador judicial e o Tribunal alegaram que só podem se manifestar no processo.

O diretor das empresas não retornou.

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