Anderson Torres chegou a dizer durante reunião com outros chefes de ministérios e com o ex-presidente que, se o Partido dos Trabalhadores (PT) vencesse as eleições de 2022, todos eles estariam “fodidos”.
Torres foi ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Jair Bolsonaro (PL) e é um dos alvos de busca e apreensão da Operação Tempus Veritatis, deflagrada pela Polícia Federal (PF) na manhã desta quinta-feira (08).
Em 5 de julho de 2022, ocorreu uma reunião da alta cúpula do Governo Federal, segundo inquérito policial.
O encontro havia sido convocado por Bolsonaro e contou com a presença de Anderson Torres; Augusto Heleno, então chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, então Ministro da Defesa; Mário Fernandes, então chefe-substituto da Secretaria-Geral da Presidência da República; e Walter Souza Braga Netto, ex-Ministro-Chefe da Casa Civil e candidato à vice-Presidência da República. Todos são alvos da operação da PF.
A reunião, segundo a Polícia Federal, “também teve como finalidade cobrar dos presentes conduta ativa na promoção da ilegal desinformação e ataques à Justiça Eleitoral: promoção e a difusão, em cada uma de suas respectivas áreas, desinformações quanto à lisura do sistema de votação, utilizando a estrutura do Estado brasileiro para fins ilícitos e desgarrados do interesse público”.
A narrativa serviu, “como um dos elementos essenciais, para manter mobilizadas as manifestações em frente às instalações militares, após a derrota eleitoral e, com isso, dar uma falsa percepção de apoio popular, pressionando integrantes das Forças Armadas a aderirem ao golpe de Estado em andamento”, segundo as investigações.
Na ocasião, Torres reiterou a narrativa de Bolsonaro e ressaltou a necessidade de os ministros propagarem informações notoriamente falsas quanto a fraudes e vulnerabilidades no sistema eletrônico de votação. Além disso, o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública reforçou o temor quanto ao que poderia acontecer caso o PT ganhasse as eleições e fez referência à Bolívia.
De forma enfática, Torres afirmou:
“E [… a] Bolívia é o grande exemplo para todos nós. Senhores, todos vão se foder. Eu quero deixar bem claro isso. Porque se… Eu não estou dizendo que… Eu quero que cada um pense no que pode fazer previamente, porque todos vão se foder”.
Durante a reunião, Torres mencionou, ainda, o conteúdo inverídico divulgado em uma live presidencial, em 29 de julho de 2021, que distorceu informações, termos de declarações e dados sobre perícias feitas pela PF.
O ex-ministro insinuou. também, que a Polícia Federal supostamente havia feito várias sugestões de aperfeiçoamento no sistema de votação, as quais que não teriam sido acatadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), segundo ele.
Torres chegou a fazer acusações graves, como relacionar a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) ao Partido dos Trabalhadores (PT), e afirmar que muita coisa viria à tona, inclusive com depoimentos.
“Isso não é mentira. Isso não é mentira”, reforçou.
O então ministro acrescentou que atuaria de forma mais incisiva, por meio da Polícia Federal, para apurar os supostos fatos.
“Mas estamos aí, presidente [Bolsonaro], desentranhando a velha relação do PT com o PCC. Isso está vindo aí através de depoimentos que estão há muito [tempo] guardados”, disse Torres.
Na manhã desta quinta-feira (08), a PF apreendeu dois HDs de computadores de Anderson Torres.
O ex-ministro de Jair Bolsonaro foi preso preventivamente no ano passado por quatro meses, por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), por supostos crimes cometidos em 8 de janeiro de 2023.
No dia dos atos golpistas, ele era secretário de Segurança Pública do DF.
Em maio, ele foi solto, sob condição de usar tornozeleira eletrônica e cumprir medidas cautelares.
Por determinação do ministro Alexandre de Moraes, a PF cumpriu, na manhã desta quinta-feira (08), quatro mandados de prisão e 33 de busca e apreensão contra políticos e militares suspeitos de planejar um suposto golpe de Estado para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro no poder.
Os presos são Filipe Martins, ex-assessor especial do Bolsonaro; Marcelo Câmara, coronel do Exército; Rafael Martins, major das Forças Especiais do Exército; e Bernardo Romão Corrêa Netto, também coronel do Exército.
Além disso, outros aliados de Bolsonaro foram alvo de mandados de busca e apreensão, como o presidente do Partido Liberal (PL), Valdemar Costa Neto; o ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) general Augusto Heleno; e os ex-ministros Walter Braga Netto (Defesa) e Anderson Torres (Justiça e Segurança Pública).
A operação recebeu o nome de Tempus Veritatis, que, traduzido do latim, significa “hora da verdade”.
Desmaio
Como o oficial que desmaiou em operação aparece na investigação da PF
Junto com Mauro Cid, oficial é investigado por integrar núcleo que, segundo a PF, espalhava fake news e tramava contra o processo eleitoral
O tenente-coronel do Exército Guilherme Marques Almeida, que desmaiou na manhã de hoje quando policiais federais bateram à sua porta para cumprir um dos mandados expedidos pelo ministro Alexandre de Moraes, aparece nas investigações como integrante do núcleo bolsonarista encarregado de espalhar fake news e atacar o sistema eleitoral brasileiro.
O nome de Marques Almeida figura ao lado de personagens já conhecidos, como Mauro Cesar Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, e Anderson Torres, ex-ministro da Justiça.
Segundo a PF, esse núcleo específico era responsável pela “produção, divulgação e amplificação de notícias falsas quanto à lisura das eleições presidenciais de 2022 com a finalidade de estimular seguidores a permanecerem na frente de quartéis e instalações das Forças Armadas no intuito de criar o ambiente propício para o Golpe de Estado”.
O mesmo grupo, diz a PF, se encarregou de fazer “estudos” sobre a suposta falta de lisura nas eleições presidenciais de 2022 e sobre supostos registros de votos após o horário de fechamento das seções eleitorais e inconsistências no código-fonte das urnas.
Conversas com Mauro Cid
Ainda de acordo com a investigação, o tenente-coronel mantinha conversas por mensagens com Mauro Cid sobre as estratégias para questionar o processo eleitoral.
Nas mensagens trocadas entre eles havia, por exemplo, o conteúdo de uma live largamente disseminada pelos bolsonaristas para espalhar a versão de que as eleições estavam sob investigação.
“Acabou para o Lula”, escreveu militar
Também falando com Cid por WhatsApp, o tenente-coronel, à época lotado no Comando de Operações Terrestres do Exército, afirma que a fraude nas eleições estaria comprovada e escreve: “Acabou para o Lula”.
Além disso, o oficial se colocou à disposição para passar adiante o material com as fake news. Depois, comemorou a criação de um site em Portugal para hospedar as informações, que haviam sido retiradas do ar aqui no Brasil. “Nosso time é bom demais”, comemora.
Ironia do destino: oficial comanda Batalhão de Operações Psicológicas
O tenente-coronel assumiu em 19 de janeiro deste ano o comando do 1º Batalhão de Operações Psicológicas do Exército, com sede em Goiânia (GO).
A unidade é vinculada ao Comando de Operações Especiais da Corporação, que reúne tropas de elite do Exército e era tido como um braço essencial no roteiro do golpe maquinado pelos bolsonaristas radicais.
Desmaio e afastamento do posto
Como a coluna (responsável por esta parte da reportagem) informou mais cedo, Marques Almeida passou mal quando os policiais federais bateram à sua porta. Ele precisou receber ajuda, mas logo em seguida se recuperou e até colaborou a equipe que fazia a operação de busca em seu endereço.
Assim como outros militares alvos da operação, por ordem de Alexandre de Moraes o tenente-coronel está proibido de manter contato com outros investigados e de deixar o país, teve de entregar seu passaporte e está suspenso de sua função pública.
Braga Netto
Mensagens extraídas do celular do ex-major Ailton Barros revelam que o general e candidato a vice-presidente em 2022, Braga Netto, xingou o então comandante do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, de “cagão”. O ministro de Jair Bolsonaro estaria irritado porque o militar não teria aderido ao discurso golpista feito naquela ocasião.
Além disso, Braga Netto também teria chamado o então comandante da Aeronáutica, Carlos Almeida Baptista Júnior, de “traidor da pátria” pelos mesmos motivos.
Essas mensagens são de dezembro de 2022 e foram reveladas em investigação da Polícia Federal (PF) que levou à operação deflagrada nesta quinta-feira (8/2) contra o presidente Jair Bolsonaro (PL) e pessoas ligadas a ele que teriam arquitetado uma tentativa de golpe de Estado.
“Cagão”
Inicialmente, em 14 de dezembro, Braga Netto enviou uma mensagem para Ailton, que seria encaminhada de um militar das Forças Especiais, criticando o general Antônio Freire Gomes, que era comandante do Exército.
“Meu amigo, infelizmente tenho que dizer que a culpa pelo que está acontecendo e acontecerá é do Gen. Freire Gomes. Omissão e indecisão não cabem a um combatente”, diz a mensagem encaminhada.
Braga Netto chamou comandante do Exército de “cagão” e chefe da Aeronáutica de “traidor”
Ailton então responde: “Então vamos continuar a pressão e se isso se confirmar vamos oferecer a cabeça dele aos leões”.
Braga Netto concorda: “Oferece a cabeça dele. Cagão”.
“Traidor da pátria”
Já no dia seguinte, em 15 de dezembro, Braga Netto criticou o tenente-brigadeiro Carlos Almeida Baptista Junior, que era comandante da Aeronáutica.
“Sobre o Batista Junior: senta o pau no Batista Junior. Povo sofrendo, arbitrariedades sendo feitas e ele fechado nas mordomias. Negociando favores. Traidor da pátria. Daí para frente. Inferniza a vida dele e da família. Elogia o Garnier e fode o BJ”, escreveu Braga Netto, seguido de uma “figurinha” com a ilustração de um chicote e a frase “desce a chibata!”.
O ex-major Ailton Barros, que recebeu essas mensagens de Braga Netto, foi candidato pelo PL a deputado estadual do Rio de Janeiro em 2022 e se apresentava como “01 de Bolsonaro” na campanha. Ele foi preso em maio do ano passado por suspeita de participar do esquema de adulteração de vacinas de Bolsonaro.
As mensagens vão de encontro à delação premiada do ex-chefe da ajudância de ordem de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, que informou que apenas o comandante da Marinha, Almir Garnier, é que teria concordado com o golpe.
Mirelle Pinheiro, Carlos Carone; Rodrigo Rangel – Metrópoles; Thalys Alcântara, Manoela Alcântara – Metrópoles