Um dos dez cardeais provenientes dos EUA a entrar no conclave, Robert Prevost saiu da Capela Sistina como Papa Leão XIV — o primeiro agostiniano e oriundo de seu país ser eleito pontífice.
Tal como o antecessor Francisco, ele sustenta posições antagônicas às professadas pelo governo Trump, sobretudo no combate à imigração, um dos carros-chefes da agenda do presidente americano.
Em fevereiro passado, Prevost criticou nas redes sociais o vice-presidente dos EUA, católico convertido há seis anos
“JD Vance está errado”.
“Jesus não pede para classificarmos nosso amor pelos outros”.
O cardeal referia-se a uma entrevista do vice de Trump na qual ele justificava, com uma falsa interpretação teológica, a repressão aos imigrantes ilegais:
“Existe um conceito cristão de que você ama sua família, depois ama seu próximo, depois ama sua comunidade, depois ama seus concidadãos e, depois disso, prioriza o resto do mundo”.
“Boa parte da extrema esquerda inverteu isso completamente”, considerou Vance.
Com a contestação, e, também, como líder do poderoso Dicastério para os Bispos, Prevost seguia a linha ditada pelo Papa Francisco, que logo após a posse de Trump, mandou carta aos bispos americanos: o Pontífice refutava, na mensagem, o conceito teológico expressado por Vance, em meio à controvérsia gerada pelo início das deportações, consideradas por ele como uma vergonha.
Nos dias que antecederam o conclave, a Casa Branca postou uma foto de Trump vestido de Papa.
O presidente anunciou a preferência pelo cardeal Timothy Dolan, de Nova York, como Papa, sendo criticado por tentar interferir no processo eleitoral.
Reflexo da situação política do país, a Igreja Católica nos EUA também está polarizada.
Partiu de alguns de seus cardeais a resistência forte a Francisco durante o seu Pontificado.
Após o anúncio do resultado do conclave, o presidente americano tomou a eleição de Leão XIV como uma honra para o país pelo fato de ser o primeiro Papa proveniente dos EUA, sem discorrer especificamente sobre Prevost.
Mas quando o nome do cardeal americano foi revelado como Pontífice, simpatizantes do movimento Maga, inundaram as redes sociais para protestar contra a escolha.
A ativista de extrema direita Laura Loomer, que costuma atuar como conselheira informal de Trump, informou a seus seguidores que o novo Papa apoia imigrantes ilegais e fronteiras abertas.
“Ele (o Papa) retuitou mensagens em apoio aos ‘sonhadores’, também conhecidos como imigrantes ilegais, e atacou o uso da expressão ‘homens maus’ pelo presidente Trump para descrever imigrantes ilegais violentos”.
“Ele considera a expressão ‘racista’”, afirmou Loomer.
Papa Leão XIV é ‘discreto e certamente amigo de Francisco’, diz padre e reitor da PUC-Rio
Discreto, Prevost era um aliado próximo de Francisco, que há dois anos promoveu-o cardeal e chamou-o de volta a Roma para liderar o Dicastério para os Bispos e presidir a Pontifícia Comissão para a América Latina.
Nas primeiras palavras como Leão XIV, ele citou várias vezes o antecessor e ressaltou que buscará uma “Igreja missionária, que constrói pontes e diálogos”.
Para bom entendedor, a relação entre o Vaticano e o atual governo dos EUA seguirá complicada.
Sandra Cohen — especializada em temas internacionais, foi repórter, correspondente e editora de Mundo em “O Globo”


