SP: cabine ‘de astronauta’, refeitório e bunker – maior tatuzão da América Latina

Portal G1 visitou tuneladora batizada de Cora Coralina, usada em expansão de linha do Metrô de São Paulo
Estrutura externa e câmaras hiperbáricas dentro do tatuzão Cora Coralina. (Foto: reprodução/Rafael Mussi/Metrô SP)

O Cora Coralina, maior tatuzão já utilizado na América Latina, entra em operação nesta terça-feira (21), dando início a uma fase importante da expansão da Linha 2-Verde do Metrô de São Paulo, no trecho entre Vila Prudente e Penha.

Para conhecer o interior dessa supermáquina e entender como ela funciona, o g1 visitou o Complexo Rapadura, canteiro de obras localizado na Vila Formosa, Zona Leste da capital paulista, onde ela está instalada.

Tatuzão é o nome popular dado a uma Tunnel Boring Machine (TBM) ou máquina de perfuração de túnel, em português. Por meio de ferramentas cortantes e aplicação de pressão, ela é capaz de abrir caminho para a passagem de trens subterrâneos em solos umedecidos pelo lençol freático.

Nesta primeira fase de operação, o Cora Coralina vai partir de Rapadura em direção à Vila Prudente, um trajeto de aproximadamente 4 km. Quando chegar lá, será desmontado e levado para a Penha, onde começará as escavações até retornar ao Complexo Rapadura.

Apesar de parecer mais complexa, essa estratégia foi definida para dar celeridade à entrega das futuras estações.

Conforme o tatuzão avança, ele segue conectado ao canteiro de obras por meio de tubulações. Ao retirá-lo do primeiro trecho, o espaço fica livre para que as demais obras necessárias sejam realizadas, de forma que as primeiras estações possam ser inauguradas enquanto a segunda parte da expansão é feita.

Estrutura e funcionamento

Com 11,66 m de altura e 98 m de comprimento, o Cora Coralina é composto por diversos equipamentos, que vão desde reservatórios de insumos a um sistema de esteiras. A tuneladora possui ainda um refeitório climatizado, banheiros químicos e um bunker para que os operários se abriguem em caso de desabamento.

Dimensões do equipamento, em comparação com um ônibus convencional, usado na capital paulista: com avanço da obra, local onde estão operadores cada vez fica mais distante da base de operações. (Foto: reprodução/arte–G1)

“A nossa base é aqui em Rapadura. A máquina vai ficando cada vez mais distante daqui, então voltar para cá pra fazer as refeições, usar os sanitários começa a ficar impraticável. A gente manda as refeições para eles na máquina e eles almoçam lá, descansam e voltam a trabalhar. No final do dia, o carrinho pega o pessoal e volta aqui para a base”, explica o engenheiro Michel Mastaler, líder de projeto do Complexo Rapadura.

Os responsáveis estimam que a tuneladora consiga avançar cerca de 15 metros por dia. A cada 1,5 m perfurado, a máquina para e segmentos de concreto são colocados para revestir o túnel por onde, futuramente, passarão os trens. Cada ciclo desse leva em torno de uma hora. Também é necessário destinar algumas horas para o reabastecimento de insumos (como água e ar comprimido) e possíveis manutenções.

Operar o tatuzão é uma missão difícil e requer mão de obra especializada. Segundo o engenheiro Tiago Oliveira Pires, líder do projeto de escavação do túnel do trecho de expansão da linha verde, o Brasil ainda não possui profissionais com essa formação. Por isso, a equipe que atuará na operação do Cora Coralina é estrangeira, majoritariamente sul-americana.

Quando o tatuzão está operando, não é possível enxergar o que há em sua frente. A única forma de fazer isso é passando pelas câmaras hiperbáricas ou cabines de despressurização, que dão acesso à parte frontal da máquina, o que acontece apenas para verificação de desgaste das estruturas cortantes e com a tuneladora desligada.

Essas cabines funcionam como aquelas utilizadas por astronautas quando precisam consertar algo no exterior das estações espaciais. Elas isolam dois ambientes com pressões diferentes e servem como um espaço de transição para o corpo (com os devidos trajes e equipamentos) se adaptar às condições adversas. O mesmo ocorre com mergulhadores de grande profundidade.

Comunidade na obra

O engenheiro Tiago Pires diz que está ciente dos transtornos que uma obra de tal magnitude causa à comunidade que vive e trabalha ao redor do complexo.

Segundo o Metrô, uma estratégia para lidar com isso e, em muitos casos, com a insatisfação dessa população, é trazê-la para dentro da obra, apresentando os principais estágios da obra e comunicando sobre novas medidas que possam impactar a região, como maior trânsito de caminhões em determinadas fases.

“Sempre que possível, a gente forma grupos e traz eles aqui pra gente poder mostrar o canteiro em si, como que está funcionando e como que a gente trabalha, qual que é a grandiosidade disso aqui, que é algo difícil de quem tá passando do lado de fora da rua perceber”, diz Tiago.

Para os engenheiros, a obra de expansão do Metrô é como um iceberg, cuja maior parte não está aparente na superfície.

A ampliação da Linha 2-Verde foi anunciada em 2012, no governo Geraldo Alckmin (PSDB).

Naquela época, a promessa era de que o trajeto fosse estendido até o município de Guarulhos. Contudo, o projeto não saiu do papel, sob alegação de dificuldades geradas pela crise econômica.

Em 2020, o então governador João Doria anunciou que o processo de expansão seria retomado, mas somente até a região da Penha.

História do Cora Coralina

Fabricada na China, a tuneladora chegou ao Porto de Santos, no litoral paulista, em 8 de maio;

O transporte das peças para a capital começou em 5 de junho. Por conta da dimensão do material, uma megaoperação de trânsito foi realizada;

A montagem do tatuzão até o estágio atual levou cerca de quatro meses;

Nesta terça (21), ele começará a perfuração partindo do Complexo Rapadura em direção à estação Vila Prudente, um trajeto de aproximadamente 4 km.

Renata Bitar, G1 SP — São Paulo

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