O Senado Federal pode ajuizar uma ação de inconstitucionalidade contra uma medida adotada pela Câmara dos Deputados.
Atribuída ao presidente da Mesa diretora, Arthur Lira (PP–AL), numa tentativa de “concentrar todo o poder nas suas mãos”, a ideia é definida pelo senador por Sergipe, Alessandro Vieira (MDB), ao denunciar a manobra, como iniciativa de rasgar “cinicamente” a Constituição e mudar o sistema sob qual o Congresso tem funcionado ao longo dos últimos 200 anos.
“Venho fazer uma comunicação, gravíssima para esta casa”, disse o senador, no início de sua colocação, no plenário do Senado.
“Como é da ciência de vossa excelência, a Câmara dos Deputados fez uma alteração no seu Regimento, que ataca diretamente a democracia, que ataca o sistema bicameral”, acrescentou.
Em publicação em seu perfil em rede social, o representante de Sergipe no Senado Federal esclarece, num texto que acompanha o vídeo do pronunciamento.
“O Brasil adota na Constituição o sistema bicameral, ou seja, são duas casas legislativas (Câmara e Senado) que se complementam e formam juntas o Congresso Nacional”, diz o texto.
“Para que este sistema funcione, os projetos são aprovados em uma das casas e depois passam pela revisão da outra”, acrescenta o texto que acompanha o vídeo, apontando ainda que “se acontecer alguma divergência, a última palavra é da primeira casa”.
“Isso funcionou bem por quase 200 anos, mas o deputado Lira achou melhor rasgar a Constituição e concentrar todo o poder nas suas mãos”, diz trecho seguinte no perfil do senador – que foi delegado de polícia e, apesar de representar o vizinho estado nordestino, é gaúcho de nascimento.
Segundo denuncia, a mudança promovida por Lira no Regimento da Câmara dos Deputados define que os projetos aprovados pelo Senado passaram a ser apensados – ou seja, anexados – em projetos da Câmara dos Deputados, alegadamente mais antigos.
Para ele, um dos efeitos práticos da manobra é que a última palavra sobre qualquer matéria tramitando no Congresso será sempre da Câmara dos Deputados – porque vai prevalecer o projeto que já estiver em tramitação lá, em detrimento de proposta apresentada pelos senadores e senadoras.
“E o segundo efeito – para mim, até o mais grave: o cidadão, que é o beneficiário final do projeto de lei, tem o seu direito retardado”, acrescentou o senador Alessandro Vieira.
Ele propôs, então, que a Mesa do Senado e a advocacia da Casa analisem a questão, “e ajuíze a competente ação perante o Supremo Tribunal Federal, com pedido de liminar”.
“Porque não é possível que qualquer cidadão brasileiro se coloque acima da Constituição, acima do parlamento, acima da república”, concluiu o senador, ao fazer a denúncia.
O presidente do Senado, senador Rodrigo Pacheco (PSD–MG), disse preferir considerar, primeiramente, “indevido, passível de ser corrigido”, que a inconstitucionalidade seja reconhecida, “dentro de um acordo político dentro do Senado e a Câmara”.
Mas, cogitou uma segunda opção: “que o Regimento do Senado também seja alterado, para suprimir a preferência dos projetos da Câmara em relação ao Senado, e aí nós vamos ter novamente o restabelecimento do balanceamento entre as duas casas”, disse Pacheco, em resposta às colocações do colega – que reconheceu como relevantes.
E acrescentou que vai tratá-la com esse grau de importância, “sem prejuízo das medidas que vossa excelência sugere”.
Ou seja: que pode, sim, recorrer ao STF para anular a manobra da Câmara.