Reportagem do UOL mostra como turismo exclui moradores em praia de luxo de AL

Ex-presidente Jair Bolsonaro vai passar o fim de ano na região; pelo turismo, moradores são obrigados a deixar casas
Pousada Villas Taturé, onde Bolsonaro passa fim de ano, tem acessos exclusivos ao mar em meio a uma fazenda deserta. (Foto: reprodução/divulgação)

Reportagem do colunista do UOL, o alagoano Carlos Madeiro, mostra o processo de exclusão numa das regiões de praias que estão se tornando destino mais badalado no litoral de todo o país.

“À esquerda da rodovia AL-101, uma estreita rua sem calçamento dá acesso à favela Cabanas do Porto, em São Miguel dos Milagres, litoral norte de Alagoas”, diz trecho da reportagem.

A matéria mostra a realidade das famílias expulsas e locais de precariedade extrema onde foram obrigadas a viver em contraste com as festas na região.

Grasiely Batista, 21: calor, mosquitos e sem saneamento em São Miguel dos Milagres (AL) e uma das festas à beira-mar, na região. (Foto: reprodução/ Carlos Madeiro/UOL; reprodução/divulgação)

“Sem saneamento e com 35 famílias em moradias precárias, a área está a 1 km da praia que hoje se tornou um dos destinos mais caros e badalados para virada de ano no Nordeste — o ex-presidente Jair Bolsonaro vai passar o fim de ano lá”.

“É o ‘Réveillon dos Milagres’, que engloba mais duas cidades da rota ecológica: Passo do Camaragibe e Porto de Pedras”.

Em muitos desses eventos, organizadores “gourmetizaram” o nome da cidade – que tem a palavra Milagres – e passaram a ostentar a expressão “believe in miracles” (acredite em milagres – em inglês).

“Do lado direito da rodovia, está o mar e suas pousadas, condomínios de luxo e terrenos com placas que repetem uma mesma ideia: “propriedade privada”, “proibido acesso”.

Antônio Amaro Nascimento Filho, 51, mora há 14 anos em São Miguel dos Milagres e terá de deixar sua casa de chão de terra em 15 dias.

“O dono pediu porque vai colocar piso e alugar ela mais caro”.

Antônio, esposa Daiana de Oliveira Silva, 29, e parte dos filhos em casa alugada em São Miguel dos Milagres (AL) e imagem da mansão de Glória Pires em São Miguel dos Milagres (Foto: reprodução/ Carlos Madeiro/UOL; reprodução/redes sociais)

Na casa vivem 11 pessoas: ele, a esposa, oito filhos e um neto.

A família paga R$ 300 ao mês e não sabe para onde vai.

“Eu cheguei a fazer casa duas vezes, mas minha área dada foi uma nascente, e ela desabou”, lamenta.

Da festa de Réveillon, diz, a comunidade só vai ouvir os fogos: “Onde moramos mal dá para ver”

O turismo de massa nos últimos anos mudou a dinâmica da cidade.

Ele é positivo por aumentar a receita do município e gerar empregos.

Entretanto, gerou problemas colaterais, como a “expulsão” de moradores das melhores áreas e o aumento do custo de vida.

Entrada para a rota dos Milagres, em Passo do Camaragibe (AL), e uma das áreas de entrada proibida. (Foto: reprodução/ Carlos Madeiro/UOL)

“A gente está vivendo nessa situação precária por causa do turismo, que ficou com todas as áreas boas”, diz Antônio.

Como foi a ocupação

Em 2009, o grupo de moradores ocupou um terreno baldio à margem da AL-101 (lado da praia).

Após nove anos, o proprietário entrou com ação de despejo para começar a vender lotes a investidores.

Os moradores tiveram de sair — inicialmente foram levados a uma quadra de e de esportes cedida pela prefeitura, onde ficaram por um ano e três meses.

Em 2019, a Prefeitura de São Miguel dos Milagres cedeu uma área, sem estrutura, para que erguessem casas e barracos.

“A gente vive na lama, cheio de mosquitos”, diz a moradora Grasiely Batista, de 21 anos.

Organizadores “gourmetizaram” o nome da cidade – que tem a palavra Milagres – e passaram a ostentar a expressão “believe in miracles” (acredite em milagres – em inglês).

“O calor dentro de casa é insuportável porque o teto tem lona”.

“Quando chove, piora porque entra água”, relata Grasiely, uma das que ergueu um barraco no local.

Carlos Madeiro – colunista/UOL

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