Radialista ganha direito de receber como jornalista

Decisão da Justiça do Trabalho em Alagoas abre um precedente, segundo advogado de profissional que obteve o direito
Local onde telejornais são editados, denominado ilha – em que o profissional editor de imagem (radialista) trabalha com editor de texto (jornalista): julgamento abre um precedente para empresas de Alagoas. (Foto: reprodução)

A Justiça do Trabalho reconheceu o direito de um radialista em Alagoas de receber como jornalista.

E além da equiparação salarial, a decisão determina o pagamento de valores retroativos – ou seja, pelo tempo em que o profissional teve o direito desrespeitado.

Segundo o advogado Marcos de Rolemberg Soares, que representou o profissional e obteve a conquista judicial, o caso abre um precedente, isto é: em todos os demais que se enquadrarem em condições semelhantes, os processos podem ser, em tese, mais simples e céleres, porque vão alegar não apenar o processo, mas, a própria decisão dos julgadores como argumento.

O representante jurídico, que também é jornalista, e foi repórter de televisão, tornou-se advogado e se especializou na área trabalhista.

Segundo ele, a particularidade da decisão, proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Alagoas, vem do fato de serem categorias profissionais distintas – e com remunerações igualmente em patamares diferenciados.

“Recurso ordinário do patronal”, diz um trecho da ementa, uma espécie de apresentação do texto de resumo da decisão do tribunal – obtido pelo blog.

Porém, vale frisar: por se tratar de um caso de relação profissional em ambiente de trabalho em que não há, necessariamente, uma denúncia, o espaço preservará a identificação do profissional beneficiado.

“Enquadramento do trabalhador. Jornalista”, acrescenta o mesmo documento.

“O juízo de primeiro grau reconheceu, de modo correto e bem fundamentado, o enquadramento do reclamante como jornalista, condenando a parte ré ao pagamento das diferenças salariais e reflexos pleiteados”, diz trecho seguinte.

Jornalistas e radialistas

A diferenciação era mais marcante, com a função de jornalista, tradicionalmente sendo considerada de nível superior e a de radialista, de nível técnico.

Mudanças, em especial, nas próprias mídias levaram a uma indiferenciação de funções, quando não uma mescla ou mesmo, com a prática daquela sendo exercida por pessoas desta qualificação – ou até sem qualificação na área ou mesmo nenhuma, técnica ou científica; tendo como determinante fatores a exemplo de aptidão comunicativa aparência ou dicção.

Aqui vale parafrasear frase atribuída à atriz Fernanda Montenegro, que teria ironizado a proliferação de pessoas sem qualificação artística nos elencos de obras como novelas e filmes, dizendo que “desinibidas havia muitas, embora poucas fossem realmente atrizes e atores”.

No caso dos jornalistas, esta conjuntura se aprofundou após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de 17 de junho de 2009, extinguindo a exigência de formação acadêmica para o exercício da profissão.

Conhecido como o caso do diploma, a decisão, à época, se deu por maioria, mas, acabou atribuída ao ministro Gilmar Mendes, então presidente da corte e relator do processo.

Porém, com a especialização, bem como a competitividade, a exigência de formação superior – e específica em cursos da área – adquiriu mais força, particularmente em mercados de trabalho maiores; em vez de acontecer o inverso.

Afinal, para muitas empresas de comunicação, a responsabilidade para o conteúdo divulgado extrapola o maior dos valores quando se trata de comunicação, jornalismo, informação: a credibilidade.

Quando há uma imprecisão, erro ou negligência, o conteúdo veiculado está passível de representação judicial.

Um dos referenciais da importância ao trabalho especializado foi nota oficial, lida no principal noticioso da Rede Globo, o Jornal Nacional, esclarecendo a posição oficial da maior emissora do país e detentora do maior número de espaços de notícias.

A Rede era frequentemente criticada por ter em seu quadro, desempenhando funções privativas de jornalistas (a exemplo de comentaristas) pessoas sem essa formação.

O caso se dava de modo mais comum nos programas de esportes, em que tais funções eram desempenhadas por ex-atletas e árbitros aposentados.

No esclarecimento, a emissora colocou que esses profissionais estavam nas transmissões para contribuir com a experiência de suas áreas, mas o que as transmissões tinham de conteúdo estritamente jornalístico era desempenhado exclusivamente por profissionais com essa qualificação.

Assim como o desempenho de todas as funções em redações de todos os noticiosos da Rede, em seus canais ou de emissoras afiliadas.

Ainda assim, nas transmissões dos desfiles de escolas de samba do carnaval do Rio, em 2024, houve críticas à inovação de colocar experts em áreas distintas ou celebridades para substituir os repórteres que cobriam a passagem das agremiações pela Marquês de Sapucaí, no “chão da avenida”.

Sobre o caso de Alagoas, o advogado Marcos de Rolemberg Soares esclarece que o enquadramento não se dará de modo indiscriminado, mas apenas nos casos em que o profissional radialista estiver exercendo função de editor – e em telejornal.

O processo foi julgado pela Segunda Turma do TRT de Alagoas e teve como relator o desembargador Laerte Neves de Souza.

O julgador utilizou processo referente à Empresa Brasil de Comunicação – EBC, a responsável por noticiosos do governo federal, entre os quais o programa de rádio “A Voz do Brasil”.

Mais especificamente, no plano de cargos e salários, em trecho que, segundo o desembargador, se refere a “editor de imagem e jornalista” e às “diferenças salariais”.

“Exercendo o empregado a função de editor de imagem, observados os termos do art. 2º, do Decreto 83.284/79, deveria ser enquadrado na categoria profissional de jornalista, profissão para a qual era, inclusive, habilitado”.

“Assim, comprovado o desvio funcional, são devidas as diferenças salariais postuladas na inicial”, diz o acórdão, o relatório com a decisão, quando o julgamento é proferido por órgão colegiado.

Para o advogado que fez a defesa do profissional, o processo servirá de referência para profissionais que estejam na mesma situação, e pretendam buscar seus direitos.

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