A Polícia Civil deverá começar pelos denunciantes a investigação sobre os supostos crimes contra a Lei de Falências na Organização Arnon de Mello (OAM).
O blog apurou que documentos visando essas primeiras diligências estão na Seção de Combate à Corrupção (SECCOR) da corporação e que as primeiras providências devem ser tomadas na próxima segunda-feira (20).
O grupo de comunicação que tem Fernando Collor como sócio majoritário está em recuperação judicial (RJ), processo para tentar evitar a falência, e durante o qual o Ministério Público identificou várias irregularidades.
Uma delas foram empréstimos aos sócios já durante o período da RJ – o que é ilegal.
As operações totalizaram R$ 6 milhões e foram feitas sob a modalidade de empréstimos de mútuo, ou seja: sem passar por instituições financeiras.
A investigação, se começar mesmo, terá início mais de dois anos depois de o Ministério Público de Alagoas apontar as irregularidades e recomendar instauração de inquérito policial.
Porém, o próprio MP levou a maior parte desse tempo para definir qual de suas instâncias deveria tomar a frente no âmbito da investigação criminal.
É que o parecer apontando os indícios dos chamados crimes falimentares foi expedido pela representação do Ministério Público junto à 10ª Vara Cível da Capital.
É nesta unidade do Judiciário de Alagoas que corre, desde 2019, o processo da recuperação judicial, uma espécie de blindagem para algumas empresas que se encontram à beira da falência.
No caso de empresas de certo porte, o mecanismo da recuperação judicial é concebido para evitar a bancarrota, levando consigo fornecedores, toda a cadeia produtiva e, sobretudo, os empregados gerados pela empresa e essa cadeia que dela dependia.
Blindagem
De início, há uma série de benefícios: nesse período, a empresa em recuperação judicial não pode sofrer penhora de bens e nem receber processos.
Sequer pode ter a falência pedida por algum dos credores.
Outro exemplo de benefícios é um dos questionamentos que constam do processo de recurso em que a Globo tenta se desfazer da sociedade com uma das empresas do grupo de comunicação de Collor.
Como reza qualquer contrato, num dos pontos mais elementares, é escolhido um foro para ajuizamento de questões que exijam intervenção judicial.
Quando as empresas associadas estão numa mesma comarca, é natural que o foro seja este.
No caso da Globo, o foro é o da Comarca do Rio de Janeiro, onde fica a sede da emissora.
Assim, caso alguma afiliada na longínqua região amazônica tenha qualquer pendência dessa natureza, precisará encaminhar as providências a cerca de 4 mil quilômetros de lá, para atender a essa exigência.
Contudo, no caso da TV Gazeta, a justiça de Alagoas entendeu, conforme um dos pontos previstos nessa blindagem dada pela recuperação judicial, que a decisão sobre o foro para decidir sobre o contrato não era o da sede da Globo, mas, o da Comarca de Maceió – que, como se sabe, manteve sociedade, numa decisão bem questionável.
Porém, esses benefícios não vêm de graça: para honrar a tal blindagem concedida pela recuperação judicial, a empresa precisa fazer seu dever de casa, a começar por colocar as contas em ordem e pagar a quem deve.
É onde aparecem algumas das irregularidades que devem ser investigadas.
A Globo apontou, no recurso contra a decisão que a obriga a manter uma sociedade que lhe traz “gravíssimos danos reputacionais”, que o diretor executivo da Organização Arnon de Mello, Luís Amorim, recebe cerca de R$ 67 mil mensais, uma contradição para uma empresa que alega estar ruim das pernas financeiramente.
Sob este mesmo argumento, as empresas de Collor propuseram pagar aos credores trabalhistas R$ 12,5 mil – e parcelados! – independentemente do tempo de trabalho que tivessem de empresa.
Por tais ardis, alguns credores trabalhistas entendem que a recuperação judicial seria, na verdade, uma manobra para dar um calote nos trabalhadores.
Advogados de alguns dos credores comprovaram que a empresa pagava despesas pessoais de Collor; o que também é ilegal.
Assim, graças a um dispositivo legal conseguiram cobrar o que têm a receber do patrimônio não das empresas, mas, do próprio Collor.
Num dos casos, após contar com o apoio do Tribunal Regional do Trabalho, o dinheiro que serviria para pagar uma dessas pessoas sumiu da conta de Collor.
A cobrança, então, recaiu sobre a da atual mulher de Collor, Caroline.
Outros credores seguiram o mesmo caminho e obtiveram decisões favoráveis na Justiça do Trabalho.
Pelo menos um imóvel de Collor foi penhorado, mas, agora, os responsáveis pela aplicação da lei se deparam com outro empecilho: localizar Collor para comunicá-lo das decisões – a chamada intimação.
Pelas irregularidades identificadas no processo da recuperação judicial, o titular da 64ª Promotoria Criminal da Capital, promotor Bolívar Cruz Ferro, encaminhou ofício para a DGPC determinando a abertura de inquérito.
A determinação foi de outubro passado e dava prazo de um mês para que a Polícia instaurasse o inquérito e informasse o “número da peça investigatória”.
Conforme se vê, somente agora a determinação deverá ser atendida.
Questionado sobre as transações irregulares, que tiveram os sócios como beneficiários e ajudaram a aprofundar a situação de insolvência das empresas de Collor, o administrador judicial (pessoa nomeada pelo juiz para acompanhar se a empresa está cumprindo com sua parte na RJ) José Lindoso disse não ver irregularidade no processo.
O parecer do Ministério Público que recomendou abertura do inquérito também propôs a destituição de Lindoso dessa função e sua substituição.
Desde a semana passada, o blog tem procurado ouvir a Delegacia Geral de Polícia Civil (DGPC), órgão diretivo da corporação e à qual foi endereçado o ofício do Ministério Público.
Foram feitos contatos com a assessoria de Comunicação Social do órgão, por aplicativos de mensagens instantâneas e por correio eletrônico.
Mas, não obtivemos resposta.