Os três senadores de Alagoas votaram “sim” no PL da Devastação

Para defensores, “desbloquear o crescimento”; para críticos, danos irreparáveis –de povos indígenas à arqueologia serão impactados
Dois dos representantes de Alagoas no Senado: a senadora Eudódia Caldas (PL) e o senador Fernando Farias (MDB) – que com o colega de plenário Renan Calheiros (MDB), aprovaram o projeto; entre os pontos aprovados está a de que licenças ambientais sejam emitidas apenas com base na autodeclaração do proprietário, sem análise técnica prévia; atualmente aplicada apenas para projetos de baixo risco e pequeno potencial poluidor. (Foto: reprodução)

Os três senadores de Alagoas votaram para aprovar a Lei Geral do Licenciamento Ambiental.

O texto foi aprovado pelo Senado Federal na última quarta-feira (21) pelo placar de 54 votos a favor e 13 votos contrários.

Os três representantes alagoanos na Casa votaram “sim”, para aprovar a projeto.

De acordo com matéria sobre o tema publicada no portal G1, “o texto dispensa o licenciamento para algumas entidades e projetos de empreendimento, por isso, a proposta é alvo de críticas por ambientalistas que apontam que o projeto pode trazer riscos para comunidades tradicionais”.

Pela mesma razão, foi denominado popularmente como PL da Devastação.

Ainda conforme o portal, “defensores do texto afirmam que as novas regras vão desburocratizar processos para obtenção de licenças ambientais”.

“Senadores ligados ao agronegócio comemoraram a aprovação”.

O portal buscou ouvir os três senadores sobre a posição deles na votação e está aberto às respostas.

O projeto tramitava no Congresso havia mais de 20 anos, já tinha sido aprovado na Câmara, mas retornará a esta Casa porque, durante a tramitação encerrada nessa quarta-feira, os senadores fizeram modificações em relação à versão aprovada pelos deputados.

Pela legislação, quando isso acontece, as matérias têm de ser analisadas novamente pelos representantes populares.

Conforme a concepção do modelo de representatividade brasileiro, os deputados federais representam a população: por isso, as bancadas estaduais na Câmara dos Deputados são definidas proporcionalmente ao número de eleitores – limitadas a até 70 integrantes.

Mas, os senadores representam os interesses dos estados: daí que independentemente do eleitorado, cada unidade da federação – os 26 estados e mais o Distrito Federal – tem três representantes cada uma.

Os de Alagoas são, pela ordem em que aparecem na chamada em plenário: Eudócia Caldas (PL), mãe do prefeito de Maceió, JHC (PL).

Ela era a suplente do mandato de Rodrigo Cunha (União).

Com a eleição dele, na chapa que reconduziu JHC à Prefeitura de Maceió, a suplente assumiu a vaga.

Situação semelhante se deu em relação ao segundo representante alagoano: Fernando Farias (MDB) – ainda que por razões distintas.

O empresário era o suplente no mandato para o qual foi eleito Renan Filho (MDB).

Com a ida do ex-governador de Alagoas para o Ministério dos Transportes, no início do governo Lula, Farias assumiu o mandato.

“O marco legal a ser criado pela proposição harmonizará e simplificará o processo de licenciamento ambiental em todo o País. Isso é essencial para reduzir a burocracia e tornar mais ágil a autorização de empreendimentos, ao mesmo tempo em que garante a proteção do meio ambiente”, afirmou uma das relatoras da proposta, senadora Tereza Cristina (PP-MS).

O que dizem os críticos e os defensores do projeto*

O Ministério do Meio Ambiente divulgou uma nota, nesta quarta-feira (21), condenando o projeto.

De acordo com a pasta, trata-se de um texto que “representa rico à segurança ambiental no país”.

Em nota, o ministério chefiado por Marina Silva pontuou que o texto “também viola o princípio da proibição do retrocesso ambiental, que vem sendo consolidado na jurisprudência brasileira, segundo o qual o Estado não pode adotar medidas que enfraqueçam direitos”.

Ambientalistas chamam o projeto de “mãe de todas as boiadas”, alegando que a proposta isenta de licenciamento diversas atividades agropecuárias.

Em nota divulgada na última sexta (16), o Observatório do Clima diz que a proposta pode “resultar em desastres e riscos à saúde e à vida da população” e “omite a crise climática”.

Já o setor do agronegócio defende que a proposta vai “desbloquear o crescimento do Brasil” e que as regras atuais impedem mais de 5 mil obras de infraestrutura devido à burocracia.

Na véspera da votação – terça-feira (20) –, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) disse que o texto “não representa retrocesso ambiental, mas sim um avanço necessário”.

Pontos polêmicos

Entre os pontos alvo de queixa por ambientalistas, estão:

Dispensa de licenciamento ambiental para atividades agropecuárias

Pelo projeto, os empresários poderão utilizar de uma certidão declaratória para atestar que não estão explorando de forma ilegal o meio ambiente.

“É uma medida que favorece o agronegócio mais predatório, enfraquece o papel do Estado e abre caminho para conflitos, danos ambientais e insegurança jurídica para os próprios produtores”, afirmou o Observatório do Clima.

Licença por adesão e compromisso (LAC)

Essa modalidade permite que as licenças ambientais sejam emitidas apenas com base na autodeclaração do proprietário, sem análise técnica prévia; atualmente é aplicada para empreendimentos de baixo risco e pequeno potencial poluidor.

A proposta do Senado estende a possibilidade para empreendimentos de médio porte e médio potencial poluidor.

De acordo com a ex-presidente do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Suely Araújo, a proposta apresentada amplia o alcance da LAC para 90% dos licenciamentos ambientais feitos no Brasil.

“Incluiria indústrias, mineração – 80% dos empreendimentos em Minas Gerais poderiam entrar em regime simplificado, por ter médio risco”.

“Querem fazer licenciamento em um clique”, afirmou Araújo.

Desvinculação de outorgas

Outra mudança apontada como nociva está na separação dos processos, possibilitando o licenciamento sem que a área esteja liberada para exploração hídrica.

Licença Ambiental Especial

O presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (União-AP) apresentou uma emenda ao projeto que foi aprovada pelo plenário que cria a Lei Geral do Licenciamento Ambiental.

Nela, Alcolumbre propõe a criação de um novo tipo de licenciamento, o Licenciamento Ambiental Especial — uma licença especial que seria liberada por decreto do governo.

Na prática, o dispositivo que Alcolumbre está sugerindo funcionaria assim:

Alguns empreendimentos poderão ser elegíveis para o Licenciamento Ambiental Especial

O Conselho do Governo — um órgão político — definiria quais obras e projetos poderiam ser elegíveis para esse novo modelo de licenciamento.

O Conselho levaria em conta se os empreendimentos são estratégicos para o país.

A licença tem que sair em 12 meses, mas rápido do que o trâmite para o licenciamento normal.

Após o protocolo da emenda no sistema, o Instituto Socioambiental (ISA) declarou que a emenda ainda pode ser utilizada para acelerar o processo de licenciamento ambiental da região da Foz Amazônica, na região conhecida como Margem Equatorial.

“Com a sanção da lei, todas as iniciativas consideradas prioritárias pelo governo deverão passar pela análise do Conselho do Governo, sendo enquadradas no licenciamento especial, de trâmite monofásico”.

“Esse novo modelo pode ter impactos significativos, inclusive sobre as obras previstas no PAC”, afirmou Alice Dandara de Assis Correia, advogada do Instituto.

O Observatório do Clima também emitiu nota afirmando que a proposta pode “desestruturar” o processo de licenciamento ambiental.

“Significa que as análises ficam à mercê das vontades políticas e prejudicam aqueles que estão na fila para terem seus processos analisados”, afirmou a entidade.

Áreas protegidas

Um outro ponto criticado por ambientalistas é a proposta que retira o status de área protegida a Terras Indígenas e Territórios Quilombolas ainda não oficializadas, o que desprotegeria inúmeras áreas habitadas por povos originários que ainda estão em processo de demarcação.

Estudo feito pelo Instituto Socioambiental (ISA) afirma que, sob as regras atuais, as obras previstas no PAC em 277 áreas protegidas da Amazônia Legal devem ter seus impactos considerados para ter permissão de execução.

“Com o PL em vigor, esse número despenca para apenas 102, desprotegendo cerca de 18 milhões de hectares de floresta — o equivalente ao território do Paraná — e abrindo espaço para um ciclo de destruição irreversível”, aponta a nota técnica.

Ainda de acordo com o documento, a nova regra “apagaria” da legislação, para efeitos de licenciamento, 259 Terras Indígenas — ou quase um terço de todas as TIs existentes — e mais de 1.500 territórios quilombolas (cerca de 80% dessas áreas).

A senadora Tereza Cristina (PP-MS), relatora do projeto na Comissão de Agricultura, defende que obras de infraestrutura não devem ser bloqueadas.

“Para isso existe uma coisa chamada mitigar o risco”.

“Então, se nós temos um problema, se vai ter algum tipo de dano, nós vamos mitigar esse dano”.

Sítios arqueológicos

Já a Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB), em uma nota técnica, apontou também a prejudicialidade que um dos trechos do texto pode trazer para a preservação de sítios arqueológicos ainda não explorados.

O texto aprovado pelas comissões prevê que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) seja consultado apenas quando existirem bens identificados nas áreas a serem exploradas.

Entretanto, o SAB aponta que nem vários sítios arqueológicos encontram-se soterrados.

“A ausência de sítios arqueológicos conhecidos em uma determinada área não exime os empreendimentos da necessidade de obtenção de manifestação conclusiva do IPHAN para obtenção das licenças”, apontou a sociedade.

O grupo também reclama que o órgão licenciador não precisará levar em consideração análises e conclusões de autoridades especializadas envolvidas no processo, como o Iphan, o que tornaria sem validade possíveis apontamentos negativos sobre a exploração de áreas históricas.

“Em Minas Gerais, licenciamentos ambientais baseados em autodeclarações de ausência de impacto sobre bens acautelados já geraram inúmeros impactos irreversíveis a riquíssimos Sítios Arqueológicos com pinturas rupestres na região do município de Diamantina, já que houve dispensa de manifestação conclusiva do IPHAN”, afirmou o grupo.

(*Com informações G1)

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