Para não ser repetitivo, citando o que já menciona o blog do jornalista Kléverson Levy, ao comentar reação a uma de suas publicações recentes, trazemos outra citação atribuída ao mesmo autor, Alfred Harmsworth, fundador do grupo de imprensa britânico Daily Mail e considerado o mais influente “barão da mídia” de seu tempo.
“Aqueles que lamentam o papel muitas vezes maligno do Mail na sociedade deveriam pelo menos saber que ele permanece assustadoramente fiel aos ideais do seu fundador”.
A publicação, no caso, envolve a prefeita Lívia Carla (Republicanos), de Barra de Santo Antônio, que conseguiu na Justiça um direito de resposta após denúncia feita pelo jornalista.
A exemplo de muitos usos de expedientes semelhantes, o texto da resposta conseguida pela prefeita – e devidamente respeitado e publicado pelo jornalista –, também começa fazendo a ressalva do tipo “respeitamos a instituição…”
O que nunca é mencionado – e nem se poderia esperar tamanha sinceridade – é o sentido implícito da mensagem: respeito a instituição – desde que não fale de mim.
No entanto, no próprio texto do direito de resposta, há um curioso, peculiar, pitoresco e revelador indício da “afinidade” da prefeita Lívia Carla com esse princípio.
Logo no início, o texto diz:
“A prefeita Lívia Carla defende a liberdade de impressão (sic) e acima de tudo enaltece o trabalho sério e isento dos jornalistas, porém não compactua com disseminação de Fake News e muito menos com insinuações levianas a seu respeito”.
Alguém esclareça que o conceito em que se baseiam não só o segmento que reúne veículos da mídia, mas, as sociedades que prezam pelo estado de direito é a liberdade de imprensa, um dos principais veículos – mas, não o único – para garantir outro ainda maior: a liberdade de expressão.
De onde saiu a alegada “liberdade de impressão” é provável que apenas os gabinetes do balneário do litoral norte alagoano tenham conhecimento.
Para além do ato falho, do mero engano ou da incapacidade cognitiva mesmo, no exercício do direito de resposta, vale o alerta do quanto encarar críticas usando mecanismos de força pode ser um caminho temerário.
Advertência que vale para os políticos, para o próprio Judiciário – e demais Poderes – e tantos quantos exercem direitos – ou que queiram continuam usufruindo deles.
“Ao citar a reportagem como ‘fake news’, termo usado nos últimos anos para descredibilizar a imprensa e os profissionais da área, é como colocar em ‘xeque’ a atuação do jornalista profissional habilitado pelo Ministério do Trabalho Brasileiro (MTB), no entanto, comparando com alguns sites e contas nas redes sociais sem qualquer cunho jornalístico”, citou o jornalista Kléverson Levy, ao mencionar a medida imposta ao seu blog.
E arremata, mais adiante:
“Afinal, vou repetir o que já disse: Jornalismo é independência e não subserviência política ou servilismo aos políticos. Afinal, ‘Jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. Todo o resto é publicidade’”.
Ou, como atribuído a Harmsworth – e a Arthur Blair (ou George Orwell, pseudônimo com que publicou o tão atual “1984”): “jornalismo é tudo aquilo que deixa alguém muito, muito irritado…” (para não me indispor com colegas de outras áreas, deixo a citação incompleta mesmo).
Descredibilizar a política e os políticos é dar espaço para quem defende o discurso de que “a sociedade é melhor sem eles”, descredibilizar o Judiciário dá no mesmo e assim por diante.
Daí para o predomínio da força sobre a razão é um passo, da vitória do fundamentalismo sobre a tolerância é apenas outro.
Como cristão, seria o primeiro a defender o boicote a uma publicação francesa que costumava (aliás, não: tinha como “linha editorial” mesmo!) não ter o menor respeito por instituições quaisquer, incluindo algumas sagradas para esta crença.
Sim, em seu país, a liberdade de expressão beira essa incongruência.
Porém, não vejo outras palavras senão atrocidade ou barbárie para classificar o morticínio cometido por grupo terrorista contra o periódico mensal francês Charlie Hebdo, em 2015, por incluir Maomé entre as charges.
Guardadas as devidas proporções – ainda mais pelo respeito devido à memória dos doze mortos –, estivemos por pouco de naturalizar tais atitudes, na época do incêndio ao prédio da produtora onde eram gravados os quadros do satírico brasileiro “Porta dos fundos”.
Procuramos o TRE, que informou não poder se posicionar sobre o caso do direito de resposta, e que esta atribuição é do juízo da 17ª Zona Eleitoral de São Luís do Quitunde.
Também procuramos ouvir a OAB, sobre tais atitudes que resultam em cerceamento prévio do direito à expressão.
Sob o argumento de não se ter conhecimento a fundo sobre o caso, a posição foi de que, também, a instituição não poderiam ser manifestar.
Do episódio, noticiado não só pelo blog do jornalista Kléverson Levy, se tem que Leonardo de Azevedo Costa, foi preso com várias notas de R$ 100 e R$ 50, e detido por porte ilegal de arma e embriaguez ao volante, após denúncia de compra de votos no município.
A Justiça converteu a prisão em flagrante em preventiva.
E foi denunciado que o preso teria ligação com a prefeita e um candidato apoiado por ela.
As autoridades, a quem cabe adotar providências, anunciam que vão tomar “medidas cabíveis” – jargão que, em muitos casos, se mostra tão ineficaz quanto útil para o esquecimento que produz.
Ou, quando não, atuam com pura e simples leniência ou, pior, pecando por inação – no popular, sem fazer nada; como, aliás, este espaço tem mostrado em relação às autoridades do Judiciário e Ministério Público de Alagoas acerca dos processos que envolvem as empresas de Collor.
Aí, ao cumprir sua função, que é trazer ao conhecimento da sociedade, a imprensa acaba sendo a responsabilizada no fim das contas.
Para resumir: alguém faz errado, outro alguém denuncia, a providência não vem e a instituição que existe para isso denuncia o erro – ficando mais fácil, no fim, culpar a imprensa.
Ah! A “imprensa” – e não “impressão” –, prefeita.