As mudanças climáticas provocadas pela ação humana – em especial a emissão de gases do efeito estufa lilberados com a queima de combustíveis fósseis – tornaram as chuvas no Rio Grande do Sul mais intensas, concluiu um “estudo rápido de atribuição” realizado por pesquisadores do ClimaMeter divulgado nesta sexta-feira (10).
O ClimaMeter é um grupo de cientistas de diferentes países que realiza análises que colocam os extremos meteorológicos em uma perspectiva climática logo após a sua ocorrência.
O grupo, liderado por pesquisadores do centro especializado em ciências climáticas da Universidade Paris-Saclay, é financiado pela União Europeia e pela Agência Francesa de Investigação (CNRS).
Em março, estudo de atribuição do ClimaMeter apontou que as atuais ondas de calor estão 1°C mais quentes do que no passado.
De acordo com a nova análise, as chuvas que atingiram a região Sul do país entre o final de abril e início de maio ficaram 15% mais intensas devido às mudanças climáticas em curso.
Metodologia do estudo de atribuição
Para chegar a essa análise, os cientistas do ClimaMeter conduziram um estudo detalhado.
Primeiro, eles examinaram dados meteorológicos dos últimos 40 anos, comparando padrões climáticos semelhantes no final do século XX (de 1979 a 2001) com os observados nas décadas mais recentes (de 2002 a 2023), quando as mudanças climáticas se intensificaram.
Assim, com base nessa análise, os pesquisadores descobriram que as depressões atmosféricas – regiões com sistemas de baixa pressão atmosférica, como o que provocou as chuvas no RS – semelhantes às que afetaram o Rio Grande do Sul agora são cerca de 15% mais intensas.
No estudo, os cientistas também avaliam a influência de fenômenos naturais como o El Niño, que influenciou fortemente o clima entre 2023 e 2024 e é conhecido por aumentar a precipitação no sul do Brasil.
Entretanto, os pesquisadores do ClimaMeter concluíram que apenas esse fenômeno não é suficiente para explicar a intensidade das chuvas históricas.
“Os achados do ClimaMeter destacam que as inundações no Rio Grande do Sul foram intensificadas pela queima de combustíveis fósseis, não pelo El Niño”, afirma Davide Faranda, pesquisador do Instituto Pierre-Simon Laplace de Ciências do Clima e um dos autores do estudo.
Segundo a mais recente atualização divulgada pela Defesa Civil do estado, 116 pessoas morreram por causa dos temporais que atingem a região sul do país desde 29 de abril.
Também há 756 feridos e 143 desaparecidos.
Além disso, o RS tem 437 dos seus 497 municípios com algum relato de problema relacionado aos temporais, com 1,9 milhão de pessoas afetadas.
Cmunidades vulneráveis
Faranda destaca que de forma geral essas inundações afetam muito mais comunidades vulneráveis, as quais são injustamente sobrecarregadas pelas consequências da crise do clima, mesmo tendo uma pequena parcela de responsabilidade pelas mudanças climáticas.
“No entanto, ainda existem maneiras de mitigar esses riscos”.
“Ao abordar as mudanças climáticas em escalas regional e global, podemos proteger vidas humanas e limitar a frequência e a intensidade de eventos climáticos extremos”.
“Isso envolve uma redução imediata das emissões de combustíveis fósseis e medidas proativas para proteger áreas vulneráveis de padrões de precipitação cada vez mais erráticos”, alerta.
Mensagem clara
Os pesquisadores destacam ainda a urgência de ações mais concretas diante dessa situação, alertando para a continuidade e agravamento de novos eventos do tipo se nada for feito.
Erika Coppola, do Abdus Salam International Centre for Theoretical Physics, na Itália, que também participou do estudo, salienta que o sudeste da América do Sul vem enfrentando um aumento na intensidade e frequência de eventos extremos de precipitação e inundações pluviais, decorrentes das emissões de combustíveis fósseis.
Por isso, a pesquisadora chama atenção para a necessidade de se pensar em estratégias que foquem principalmente em cessar essas emissões.
“A mensagem é clara e nossos resultados nos direcionam para a mesma direção, identificando o componente humano como responsável por isso”.
“Não há tempo para esperar por ações, dada a alta vulnerabilidade da região a eventos climáticos extremos e seus impactos na segurança alimentar, infraestrutura e saúde”, diz.
Luiza Vargas, também autora do estudo e graduada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, reforça a necessidade urgente de investimentos em infraestrutura no estado, que já sofria com os efeitos do El Niño, que aumentaram a precipitação na região e causaram inundações no passado.
“A infraestrutura existente para lidar com precipitações extremas e inundações mostrou-se insuficiente neste evento, resultando no deslocamento de milhares de famílias, especialmente aquelas com menor status socioeconômico”, pontua Luiza.
“É evidente a necessidade urgente de investimentos em infraestrutura e planos de contingência de emergência para mitigar tais eventos extremos, que se espera que se tornem mais frequentes sob as mudanças climáticas”, destaca Luiza Vargas.
Roberto Peixoto — G1