Ministério da Justiça deve lançar diretrizes sobre uso de câmeras por policiais

Um dos detalhes é se gravação deve ser ininterrupta ou se policial poderá escolher o que gravar – como prevê governo de SP
Câmera corporal na farda de um policial militar de São Paulo. (Foto: reprodução / TV Globo)

O Ministério da Justiça deve lançar, na terça-feira (28), diretrizes nacionais para o uso de câmeras corporais por policiais e outros agentes de segurança.

Segundo o blog apurou, o documento deve definir se os agentes vão poder ou não escolher o que gravar.

O ministério avalia que há evidências científicas de que câmeras corporais reduzem o uso de força e as reclamações relativas à conduta do policial, e deve levar em consideração a adoção da política pelos estados para definir repasses de recursos dos fundos Nacional de Segurança Pública e Penitenciário Nacional.

O anúncio vai ocorrer dias depois de o governo de São Paulo lançar um edital para a contratação de câmeras que prevê que os policiais militares vão poder escolher se gravam ou não uma ocorrência (veja mais detalhes na reportagem acima), como revelaram a GloboNews e o G1 (responsáveis por esta reportagem).

Hoje, todas as câmeras fazem gravação de forma ininterrupta, e os PMs não têm autonomia para escolher o que desejam registrar.

Tudo é gravado, ao menos em vídeo.

O que eles podem fazer é acionar para ativar o som e melhorar a qualidade da imagem.

O novo modelo pode dificultar investigações de atos de violência policial porque deixará a decisão sobre ligar ou não o equipamento a cargo dos agentes, segundo Daniel Edler, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV/USP).

“Quando a câmera não tem a discricionariedade do policial, ou seja, quando ela grava todo o turno, ela tem uma redução muito grande do uso da força”.

“E isso dá por vários motivos: pelo policial de fato atuar dentro da legalidade, mas também pela pessoa que está sendo filmada não escalar uma situação, não agredir o policial […] Quando você só tem a gravação a partir da discricionariedade do policial, os estudos mostram o impacto é muito reduzido”.

O ministro dos Direitos Humanos, Silvio de Almeida, classificou a decisão de São Paulo de “verdadeiro teatro”.

“Ora, se de um lado há policiais que vão ligar e há outros que vão desligar a câmera, onde está o critério de preservação das vidas envolvidas em ações policiais?”

“Me parece que o governo de SP ignora o fato de que a câmera também serve para proteção da vida dos policiais”.

“Esse é mais um retrocesso inominável, verdadeiro teatro”, disse Almeida ao blog.

Tarcísio: câmera poderá ser acionada com tempo retroativo

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) ressaltou que o novo modelo permite que, além do policial, o Centro de Operações da Polícia Militar (Copom) faça o acionamento remoto das câmeras, e que isso trará mais “governança” às gravações das ocorrências policiais.

“Você tem a possibilidade de retroagir no tempo [nas novas câmeras]”.

“Então, se houver um estampido, o Copom pode acionar a câmera com o tempo retroativo”.

“Você tem uma governança muito melhor do que vai ser gravado, tem um compliance maior”.

“Você sai daquela situação de ir para uma operação, acabar a bateria, e a câmera não filmar”.

“Então, você vai passar a ter uma governança muito melhor, uma qualidade de imagem muito maior e um controle muito melhor das operações que vão estar em campo”, declarou Tarcísio.

O edital prevê que, uma vez a gravação iniciada, o vídeo gravado no equipamento deverá retroagir 90 segundos, incluindo sua faixa de áudio no mesmo intervalo de tempo.

Atendimento psicológico online

Além das diretrizes para as câmeras corporais, o Ministério da Justiça deve anunciar na terça um programa de atendimento psicológico online para agentes de segurança.

O serviço deve ser oferecido inicialmente para profissionais de Distrito Federal, Minas Gerais, Sergipe e Rio Grande do Norte e, a partir de 2025, para os de outros estados.

Isabela Leite, Andréia Sadi

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