Milei é eleito presidente e inaugura novo momento político na Argentina

Economista ultraliberal que ficou famoso na TV chega ao poder com discurso incendiário antipolítica e propostas como fechar o BC e dolarizar a economia
Onze pontos percentuais de diferença (quando se esperava disputa maior) e mais votado em vinte das 23 províncias que compõem o país: os argentinos pediram Milei. (Foto: reprodução)

O economista ultraliberal Javier Milei, do partido A Liberdade Avança, venceu neste domingo (19) a eleição para a Presidência da Argentina.

Com 97% das urnas apuradas, Milei tem 55,76% dos votos, contra 44,23% de Sergio Massa, ministro da Economia e candidato governista.

A diferença superior a 11 pontos percentuais (quase 3 milhões de votos) surpreende, porque as pesquisas indicavam um cenário mais acirrado.

Cerca de 26 milhões de argentinos votaram, 76,3% do total. Milei foi mais votado em 20 das 23 províncias do país, além da capital Buenos Aires, que é uma cidade autônoma.

Primeiro discurso

“Hoje começa a reconstrução da Argentina”, disse o presidente eleito no primeiro discurso. Milei agradeceu ao ex-presidente Mauricio Macri e à ex-candidata Patricia Bullrich, que decidiram apoiá-lo no segundo turno. “Colocaram o corpo para defender a mudança de que a Argentina necessita”, afirmou.

No primeiro discurso como presidente eleito, Milei foi mais contido do que costuma ser. Pregou pautas liberais e criticou a classe política, mas adotou um tom mais conciliador. Não mencionou suas propostas mais radicais, como dolarizar a economia, nem detalhou medidas que pretende tomar.

Disse que é uma noite histórica e que considera um milagre a Argentina ter um presidente “liberal e libertário”.

“Hoje começa o fim da decadência argentina, termina o modelo empobrecedor do Estado onipresente”, disse ele. “A Argentina tem futuro, e esse futuro é liberal”, afirmou. “Se abraçamos essas ideias, não vamos apenas poder resolver os problemas de hoje, mas dentro de 35 anos voltaremos a ser uma potência mundial.”

“A situação da Argentina é crítica. Não há lugar para gradualismos nem para fraqueza, não há lugar para meias medidas”, disse. “Se não avançarmos rápido com as mudanças estruturais de que a Argentina necessita, nos dirigimos para a pior crise da nossa história”, acrescentou.

Ao se referir ao atual governo, pediu que “assumam sua responsabilidade até o fim do mandato”. “Ao governo queremos pedir que sejam responsáveis, que entendam que chegou uma nova Argentina e atuem de forma consequente”, afirmou. “Uma vez finalizado o mandato, poderemos transformar essa realidade tão trágica para milhões de argentinos.”

Massa reconheceu a vitória de Milei antes mesmo de os primeiros números serem divulgados oficialmente. “Javier Milei é o presidente eleito pela maioria dos argentinos”, disse ele em discurso para apoiadores.

Milei tomará posse em dezembro para 4 anos de mandato. Sua vitória vem após uma virada no segundo turno, já que Massa havia sido o mais votado na primeira etapa da eleição.

Entenda os desafios econômicos que o novo presidente precisará enfrentar

Aos 52 anos, Milei será o 52º presidente do país e terá que enfrentar a pior crise econômica em décadas, com a maior inflação em mais de 30 anos, dois quintos da população vivendo na pobreza e forte desvalorização cambial. Desafios agravados por uma dívida externa bilionária e pela falta de reservas internacionais.

Durante a campanha, ele encampou propostas radicais para atacar esses problemas, como promover a dolarização da economia Argentina e acabar com o Banco Central do país.

Economista de formação, Milei se promove como um nome de fora da política tradicional que diz querer combater o que chama de “casta política” da Argentina.

Antes de se aproximar da política, ele atuou no setor privado, trabalhando em banco e em uma empresa que administrava aposentadorias e pensões. Também chegou a atuar como economista-chefe da Fundação Acordar, ligada ao peronista e ex-candidato à Presidência Daniel Scioli.

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Professor universitário, Milei só se tornou mais conhecido do público argentino ao passar a ser convidado para falar em programas de rádio e, especialmente, TV.

Em 2021, com um discurso inflamado “contra tudo e contra todos”, venceu sua primeira eleição para o cargo de deputado federal por seu partido A Liberdade Avança, fundado no mesmo ano.

Costuma ser comparado por analistas políticos ao ex-presidente americano Donald Trump e ao ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro.

A vida pessoal de Milei se tornou assunto na campanha com a publicação de uma biografia não autorizada pelo jornalista Juan Luis González, que mostra a relação do economista com o esoterismo depois da morte do cachorro dele, Conan, em 2017.

Milei clonou o animal e procurou formas de falar com ele após a morte. Amigos e conhecidos dizem que ele também se diz capaz de falar com economistas mortos.

Hoje, são quatro cachorros, todos mastins ingleses que pesam 90 quilos, segundo a imprensa argentina: Murray, Milton, Robert e Lucas. Milei costuma dizer que eles são “seus filhos de quatro patas” e ainda se refere a Conan, como quando discursou após vencer as prévias. “Obrigado, Conan, Murray, Milton, Robert e Lucas”, disse Milei em 13 de agosto.

Os nomes dos cachorros homenageiam economistas que Milei admira: Murray Rothbard, Milton Friedman e Robert Lucas. Já o nome de Conan é uma referência ao filme “Conan, o Bárbaro”, de 1982.

Governabilidade

No pleito legislativo deste ano, o partido de Milei, A Liberdade Avança, foi o que mais cresceu, saltando de três deputados e nenhum senador para 38 deputados e oito senadores.

No dia 22 de outubro, os argentinos votaram no primeiro turno das eleições presidenciais e para renovar 130 cadeiras das 257 na Câmara dos Deputados, e 24 cadeiras das 72 no Senado.

Na nova legislatura, a sigla de Milei se tornará a terceira maior bancada do Congresso, atrás da coligação peronista de Sergio Massa, que conta com 108 cadeiras da Câmara, e da coalizão de centro-direita representada no primeiro turno pela ex-ministra Patricia Bullrich, que ficou com 93 deputados.

Somados, os partidos de oposição ao peronismo (Liberdade Avança e Juntos pela Mudança) têm mais deputados do que a bancada do União pela Pátria.

G1

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