Em uma nova tentativa de pôr fim à parceria forçada com a TV de Fernando Collor em Alagoas, a Globo entrou com um recurso junto ao presidente do STJ, Herman Benjamin, para que ele derrube decisão do judiciário alagoano que determinou a renovação do contrato da emissora com a TV Gazeta por cinco anos.
A coluna teve acesso à íntegra do pedido, entregue no dia 14 de janeiro, que corre em segredo de Justiça.
Esse tipo de recurso direto ao chefe do STJ contra uma decisão de um Tribunal de Justiça, segundo advogados consultados, é bastante raro e foi feito pela Globo com base na Lei nº 8.437/1992, sancionada pelo próprio Collor quando era presidente da República.
No recurso, a Globo al alega que a decisão do TJAL (Tribunal de Justiça de Alagoas) “incorre em lesão à ordem pública ao aplicar o princípio da preservação da empresa de forma desproporcional e abusiva”.
Cita também que já celebrou novo contrato com o grupo da TV Asa Branca, de Caruaru (PE), para retransmissão de sua programação em Alagoas
Diante disso, a Globo solicita que Herman derrube o acórdão do TJAL e a autorize a romper com a TV do ex-presidente até o julgamento dos recursos que já interpôs no mesmo STJ e no STF (Supremo Tribunal Federal) contra a decisão em Alagoas, mas ainda não foram julgados. Nesses recursos, a Globo alegou que o judiciário alagoano descumpre leis.
“Lesão gravíssima”
A Globo argumenta que a imposição de um contrato com a emissora de Collor “prejudica a qualidade e a independência da programação”, além de afetar a “ordem pública, econômica e social”.
“A situação lesiva é objetiva, patente, concreta e gravíssima”, relata.
O principal argumento para desfazer a parceria é que a TV Gazeta é controlada por pessoas “já condenadas pelo STF por corrupção praticada na prestação do serviço público”, caso de Collor.
No julgamento que condenou Collor a oito anos de prisão, os ministros do STF levaram em conta que a TV Gazeta foi usada para receber recursos desviados, advindos de corrupção de uma subsidiária da Petrobras na qual o ex-presidente tinha influência.
Além disso, a Globo defende a liberdade contratual e o direito de escolher parceiros que garantam um serviço de radiodifusão “mais moderno e eficiente para a população alagoana”.
Sem o controle direto da Globo sobre quais empresas divulgam esses conteúdos, há a possibilidade de que informações sejam veiculadas de maneira incompatível com os padrões editoriais e éticos que a Globo adota, gerando riscos significativos à qualidade e imparcialidade da informação disponibilizada ao público, usuários do serviço público de radiodifusão.
“Mais do que isso, há, como consequência, a perpetuação indesejada de uma situação em que os telespectadores de Alagoas apenas podem ter acesso à Rede Globo por meio da TV Gazeta”, Globo em recurso ao STJ.
Em sua defesa na Justiça, a TV Gazeta afirmou que a não renovação da Globo pegou a TV de surpresa e que a emissora abusou da boa-fé, já que ela representa 72% do faturamento do grupo —e o fim da parceria a levaria à falência.
Em junho de 2023, a 3ª Câmara Cível do TJAL decidiu, por dois votos a um, ratificar a decisão do juiz da recuperação judicial (condição na qual o grupo está desde 2019), que decidiu que o contrato com a Globo era essencial para a manutenção da TV Gazeta e seu consequente pagamento de credores e trabalhadores.
A decisão do TJAL contrariou parecer do MPAL (Ministério Público de Alagoas), que opinou pela não-obrigação de as TVs manterem o contrato forçadamente.
“O acórdão do TJAL chancelou a superlativa lesão à ordem pública implementada contra a prestação do serviço público”, argumenta a emissora carioca, em trecho de seu recurso
“É inadequada, porque, além de desconsiderar a liberdade de programação da concessionária de serviço público, não garante o efetivo soerguimento da TV Gazeta. Assim, ao privilegiar a recuperação judicial da TV Gazeta, a decisão desconsiderou os riscos e impactos à qualidade e diversidade de conteúdo disponibilizado”, Globo em recurso ao STJ.
As duas emissoras não comentam sobre esse processo judicial.
Calotes e penhora
Por não pagar dívidas trabalhistas, Collor e a atual esposa já tiveram as contas bloqueadas, mas apenas Caroline Serejo Collor de Mello teve saldo robusto encontrado; Collor tinha R$ 14,97.
Em julho, ela teve R$ 476 mil retirados para pagamento de uma ex-trabalhadora com câncer que tentava receber indenização desde julho de 2019.
Em outubro, a coluna revelou que a chácara que Collor tem em Campos do Jordão (SP) também foi penhorada por ordem do juiz Sérgio Roberto de Mello Queiroz, da 5ª Vara do Trabalho de Maceió.
O imóvel está avaliado em R$ 10,5 milhões.
No mesmo mês, a juíza Thais Costa Gondim, titular da 6ª Vara do Trabalho, penhorou a cobertura duplex, com 600 m² de área privativa, que fica à beira-mar do bairro da Jatiúca, um dos mais valorizados do litoral de Maceió.
O bem foi omitido da declaração entregue à Justiça Eleitoral em 2022.
No último dia 3, o juiz Hamilton Aparecido Malheiros, da 8ª Vara do Trabalho de Maceió, determinou a penhora das cotas sociais das empresas de comunicação de Collor para quitar uma dívida trabalhista.
A decisão do último dia 3 atendeu a um pedido feito por um ex-funcionário da TV Gazeta.
Carlos Madeiro — colunista do UOL