Filha de Cupertino diz em júri que pai a prendeu por 8 meses ao saber de namoro com ator

Paulo Cupertino é acusado de matar ator e família a tiros em 2019 por não aceitar relacionamento
Isabela Tibcherani conta durante seu depoimento no júri de Paulo Cupertino que colocou as mãos nos ouvidos por causa do barulho dos tiros; júri chegou a ser cancelado após réu demitir advogado. (Foto: reprodução / TJ-SP)

Vídeo gravado pela Justiça com o depoimento da filha de Paulo Cupertino mostra o que Isabela Tibcherani falou sobre o pai, na semana passada, durante o julgamento dele pelos assassinatos do namorado dela, Rafael Miguel, e dos pais do ator em 2019 em São Paulo.

O G1 (responsável por esta reportagem) teve acesso a esta gravação filmagem de Isabela e à gravação da mãe dela, Vanessa, outra testemunha no caso.

Nesta, Vanessa relata no plenário sobre o ex-marido.

As duas se emocionaram e choraram nos depoimentos, que duraram mais de duas horas no total.

Eles ocorreram em 10 de outubro no Fórum Criminal da Barra Funda, na Zona Oeste.

Vanessa foi a primeira a depor e contou que o ex-marido era agressivo e batia nela.

Isabela falou depois e lembrou que também apanhava do pai, principalmente quando ele descobriu que a filha estava namorando Rafael.

Chegando ao ponto, segundo Isabela, de mantê-la presa dentro da própria casa durante oito meses.

De acordo com ela, Cupertino ainda zombava da situação, dizendo que a filha só iria namorar depois dos 30 anos e apenas se ele deixasse.

Segundo o Ministério Público (MP), em 9 de junho de 2019, Cupertino matou com 13 tiros Rafael, de 22 anos, e o casal João Miguel, de 52, e Miriam, 50.

De acordo com a acusação, o empresário cometeu o crime por ciúmes, por não aceitar o namoro da filha com o artista.

Ela tinha 18 anos à época.

Atualmente está com 23.

“Oito meses sem contato”, diz Isabela

A representante do Ministério Público perguntou a Isabela que punição Cupertino deu a ela quando descobriu que a filha estava namorando Rafael:

Promotora Soraia Simões – “Você ficou presa por quanto tempo?”

Isabela – “Oito meses, sem contato, sem celular, sem convívio com outras pessoas, só dentro de casa.”

A filha de Cupertino também lembrou que o pai a proibiu de se relacionar com Rafael ou com qualquer outro garoto e passou a monitorar o celular dela:

Isabela – “Ele falava em brincadeiras e conversas paralelas com pessoas conhecidas: ‘Você só vai namorar depois dos 30, se eu deixar’.”

Isabela ainda contou que, mesmo distante fisicamente de Rafael, usava o telefone da mãe para falar com o namorado.

No total, o relacionamento dos dois durou pouco mais de um ano.

E um dia eles resolveram se reencontrar. Seria a última vez que se veriam.

Rafael e os pais dele decidiram levar Isabela para a casa dela, mas, ao chegarem ao local, encontraram Cupertino abrindo o portão.

Segundo Isabela, o pai a puxou para dentro, fechou a porta, e ela escutou tiros.

Isabela – “A mãe do Rafael, quando viu meu pai, ela falou: ‘Você que é o pai de Isabela?’ ‘Não, eu sou a mãe.’ Me puxou para dentro e fechou o portão de maneira agressiva. Mas aí veio o Rafael, falou: ‘Não, vamos conversar’. Segurou o portão (…) Eu já estava dentro de casa (…) E eu ouvi meu pai dizendo: ‘Conversar, nada’. E a partir daí eu só ouvi os disparos. Foram muitos disparos. Eu agachei no chão. Com as mãos no ouvido, gritava muito. Falava: ‘Não, não, não’ (…) E quando os disparos terminaram, eu saí e me deparei com a cena, que era o corpo do Rafa em cima do corpo da mãe dele, que estava perto da guia (…), que estava perto do carro, e o corpo do pai do Rafael estava no meio da rua (…) Eles não tiveram tempo de muita coisa.”

‘Mitomaníaco’, fala Vanessa sobre ex

Antes do julgamento da semana passada, a defesa de Cupertino chegou a dizer à imprensa que seu cliente alegou que não foi ele quem atirou nas três vítimas, mas uma outra pessoa não identificada, que, assim como o empresário, também fugiu após o crime.

Isabela e Vanessa não viram como Rafael, Miriam e João foram baleados, mas disseram que quem os matou foi Cupertino.

Elas moravam numa residência na Estrada do Alvarenga, no bairro Pedreira, na Zona Sul. Câmeras de segurança gravaram o crime e a fuga de Cupertino.

A ex o chamou de mentiroso e misógino.

Vanessa – “É muito estranho uma pessoa negar veementemente, veementemente, ser tão…. ah, eu tenho a palavra: mitomaníaco”.

“Ao ponto de falar e afirmar com tanta firmeza de que não cometeu um crime quando, na porta da casa onde o corpo do Rafael tava, com um tiro na cabeça e vários outros pelo corpo, dona Miriam na calçada…”

“Seu João Alcisio rolando pela rua… e o estabelecimento colado parede com parede… Uma câmera aqui, outra aqui. Desculpa, cara, é produção de prova contra si próprio.”

Cupertino, que tem 54 anos e está preso, acompanhou algemado o depoimento da ex, de 44 anos.

Mas não pôde ouvir o que a filha falou porque foi retirado do plenário por determinação da Justiça, a pedido dela.

Em seguida, o réu, bastante irritado com a situação, demitiu no intervalo o seu advogado, Alexander Lopes, obrigando o juiz do caso, Antonio Souza, a cancelar o julgamento.

Em outras palavras, o magistrado dissolveu o Conselho de Sentença, ou seja, dispensou os sete jurados escolhidos para aquele júri.

Cupertino terá de escolher um novo advogado para defendê-lo ou ser assistido gratuitamente pela Defensoria Pública.

Quando isso ocorrer, a Justiça marcará uma nova data para o julgamento do réu e escolherá novos jurados.

Cupertino responde por triplo homicídio duplamente qualificado, por motivo fútil e recurso que impossibilitou a defesa das vítimas.

Amigos de Cupertino também são réus

Além de Cupertino, os amigos dele, Eduardo Machado, de 45 anos, e Wanderley Senhora, de 59, são réus no mesmo processo e serão julgados no próximo júri.

Eles são acusados de favorecimento pessoal por terem ajudado o empresário a fugir e se esconder após o crime.

Ambos respondem em liberdade e, segundo as suas defesas, também negam as acusações.

Cupertino chegou a se esconder em outros estados e países.

Ele só foi preso quase três anos após o crime, em 17 de maio de 2022, quando a Polícia Civil o encontrou escondido e disfarçado, com identidade falsa e nome de outra pessoa num hotel em São Paulo.

Rafael Henrique Miguel e os pais dele, João Alcisio Miguel e Miriam Selma Silva Miguel. (Foto: reprodução / TV Globo e Arquivo pessoal)

Cupertino chegou a dizer aos jornalistas que acompanharam sua prisão que ele é “inocente” e não matou “ninguém”.

Apesar disso, ficou em silêncio quando foi interrogado na delegacia e ainda não falou nada à Justiça sobre os assassinatos e sua fuga.

O empresário está preso preventivamente no Centro de Detenção Provisória (CDP) de Guarulhos, na Grande São Paulo.

Promotora pode usar vídeos dos depoimentos

Apesar de a promotora Soraia querer que Vanessa e Isabela compareçam ao novo julgamento no fórum para falar do crime, as duas não são obrigadas a ir.

Além delas, outras 13 testemunhas deverão depor. “O ideal é ouvir as duas novamente”, disse a promotora.

“Os depoimentos colhidos podem ser exibidos no próximo julgamento”.

“É prova do processo”.

“O ideal é ouvi-las novamente no próximo julgamento para que os jurados possam protagonizar a prova”.

O depoimento da Isabela principalmente é muito impactante”, falou a represente do MP nesta quinta-feira (17) ao G1.

Depois, os réus serão interrogados.

E os jurados votam para decidir se condenam ou absolvem os acusados.

A sentença será dada pelo juiz.

Rafael era conhecido na mídia por ter interpretado o personagem Paçoca na novela “Chiquititas”, do SBT, e trabalhado em um famoso comercial em que uma criança pede brócolis à mãe.

Ele também atuou em novelas da Globo, como “Pé na Jaca”, “Cama de Gato” e o especial de fim de ano “O Natal do Menino Imperador”.

Nos vídeos gravados dos depoimentos que deram na Justiça, mãe e filha lembraram com carinho de Rafael.

Vanessa – “Uma pessoa familiar para mim. Excelente. Não tem nada que desabonasse.”

Isabela – “Um menino doce, inteligente, engraçado, dedicado. Era apegado à família, apegado aos valores da família, frequentava a igreja. Ele era um menino excepcional.”

Kleber Tomaz — G1 SP / São Paulo

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