Enchente na Espanha: moradores sem comida, lojas são saqueadas e Exército vai às ruas

Número de mortos chegou a 205 nesta sexta; grande maioria morreu em Valência e arredores da cidade
Carro submerso na lama em Paiporta, bairro sul de Valência, na Espanha, enquanto outro ficou pendurado, após enchente, em 1º de novembro de 2024; ao lado, trabalho de bombeiros para drenar acesso a túnel onde pilha de carros se formou após passagem da enchente histórica. (Foto: Nacho Doce/ Reuters; reprodução / Susana Vera/ Reuters)

Três dias após a maior enchente do século na Espanha, que deixou 205 mortos, moradores pediram ajuda das autoridades nesta sexta-feira (1º).

Parte da população de Valência, a terceira maior cidade da Espanha e onde a enchente tomou parte das ruas, empilhou carros e deixou um cenário de “terra arrasada”, estava sem comida, energia e água nesta sexta.

Autoridades locais e nacionais enfrentam uma onda de críticas por não terem enviado alertas à tempo.

Nesta sexta, o número de mortos subiu para 205, e ainda havia dezenas de desaparecidos.

O ministro dos Transportes espanhol afirmou que muitas pessoas ficaram presas dentro de carros.

Dezenas de ruas ainda tinham carros empilhados por conta da força da água, e houve saques a supermercados e shoppings.

A Polícia Nacional da Espanha prendeu cinco pessoas acusadas de saquear uma loja de joias em um shopping em Aldaia, município na região metropolitana de Valência.

Nesta sexta-feira (1º), o governo espanhol determinou o envio do Exército para a região.

Segundo o governo, militares ajudarão na limpeza de ruas e no envio de alimentos a moradores do sul de Valência, a parte mais afetada pela enchente.

Desde quinta-feira, centenas de pessoas começaram a ir ao sul de Valência com rodos e alimentos em mutirões organizados pelas redes sociais para ajudar a população local.

Nesta manhã, no entanto, a Defesa Civil pediu para que voluntários parem de ir à região afetada para não atrapalhar o trabalho de resgate, que ainda estava em curso nesta sexta.

Milhares de voluntários estão chegaram à cidade nesta sexta com rodos e alimentos para ajudar a população local nos trabalhos de limpeza e a se recuperar das enchentes.

Vista aérea mostra trecho de ponte que foi levada por força das águas após temporal atingir a região de Valência, em 1º de novembro de 2024. — Foto: Susana Vera/ Reuters

Em um cenário de “terra arrasada”, equipes de resgate ainda buscavam por corpos de vítimas nesta sexta, principalmente nos bairros do sul e nos municípios ao lado de Valencia, como Paiporta e Torrent, os mais afetados.

A suspeita é que a maioria dos desparecidos estejam dentro de carros que foram engolidos pela lama.

Moradores locais relataram que muitas pessoas saíram de casa no início da tempestade para tirar seus carros de garagens no subsolo de prédios, mas acabaram surpreendidos pela enchente.

A costa mediterrânea da Espanha, onde a cidade de Valência está localizada, está acostumada a tempestades de outono que podem causar enchentes, mas esta foi a mais poderosa a atingir a região neste século.

Cientistas relacionam o evento às mudanças climáticas, que aumentaram a temperatura do mar Mediterrâneo.

A enchente foi considerada pelo governo da Espanha o pior desastre do século 21 no país.

Em apenas oito horas, choveu o esperado para o ano inteiro na região afetada.

O ministro dos Transportes e da Mobilidade espanhol, Óscar Puente, disse que cerca de 80 km de rodovias no leste do país estão seriamente danificadas ou bloqueadas, muitas delas por carros abandonados.

As enchentes, provocadas por chuvas torrenciais, deixaram um rastro de destruição, e exigiram esforços de resgate para atender a população afetada em diversos municípios no leste do país.

A força das águas arrastou carros e transformou ruas de vilarejos em rios. Veículos destruídos ficaram empilhados, fios de energia caíram e móveis domésticos ficaram atolados em uma camada de lama pelas ruas.

Uma ponte foi derrubada pela força da correnteza de um rio em Picanya, e uma mulher foi resgatada de helicóptero com um cachorro no colo e a água batendo em seu pescoço em Utiel, a oeste da cidade de Valência.

Um bebê e uma idosa foram resgatados da enchente por helicóptero nos municípios de Alzira, ao sul do estado, e Catarroja, ao sul da região metropolitana de Valência, respectivamente.

Queixas de demora no envio de alertas

Passada a calamidade inicial, o governo da Espanha vem sendo alvo de uma onda de críticas sobre a demora no envio de alertas pela enchente.

Moradores locais relataram que esse alerta só foi enviado por volta das 20h no horário local, quando a água já arrastava carros por ruas da cidade.

Em declaração na quinta-feira, o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, disse que a tempestade ainda não acabou, pediu para as pessoas não saírem de casa e para ouvirem as recomendações dos serviços de emergência.

Soldados ajudam nos resgates

Com danos que lembram um forte furacão ou tsunami, as tempestades e enchentes que atingiram a região de Valência nesta semana são as piores registradas neste século, segundo a Aemet.

A agência disse ainda que o impacto foi maior que as enchentes de 2019 e comparável aos dois grandes temporais dos anos 1980: a chamada enchente de Tous, em 1982, e outro em 1987.

Mais de mil soldados das unidades de resgate de emergência da Espanha se juntaram aos trabalhadores de emergência regionais e locais na busca por corpos e sobreviventes.

A ministra da Defesa, Margarita Robles, disse que somente os soldados já haviam recuperado 22 corpos e resgatado 110 pessoas até a noite de quarta-feira.

Até a noite de quarta-feira, autoridades regionais disseram ter resgatado com helicóptero cerca de 70 pessoas presas em telhados e nas casas.

Diversas campanhas de doação para ajuda aos desabrigados estão sendo organizadas na Espanha.

O clube Real Madrid anunciou a doação de 1 milhão de euros para os afetados.

As enchentes começaram após chuvas torrenciais que atingiram a região de Valência na terça-feira (29).

As tempestades levaram as autoridades nas áreas mais atingidas a aconselhar os cidadãos a ficarem em casa.

O presidente regional do leste de Valência, Carlos Mazón, disse nesta quarta que algumas pessoas permaneciam isoladas pelas enchentes.

“Se os [serviços de emergência] não chegaram, não é por falta de recursos ou disposição, mas por um problema de acesso,” disse Mazón, acrescentando que alcançar certas áreas era “absolutamente impossível.”

O serviço meteorológico das regiões de Valência e da Catalunha emitiu alertas vermelhos para tempestades com ventos fortes e granizo.

Um trem de alta velocidade que tinha quase 300 pessoas a bordo descarrilou perto de Málaga. Autoridades locais não relataram feridos.

O serviço de trens entre Valência e Madri foi interrompido, assim como outras linhas na região.

Vídeos compartilhados nas redes sociais durante a noite mostraram pessoas presas pelas águas da enchente e outras em árvores para evitar serem levadas pela correnteza.

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