O credor trabalhista que tinha conseguido na justiça o controle acionário das empresas de Collor recebeu sua indenização trabalhista.
O crédito devido ao ex-empregado foi pago em valor integral.
Para todos os demais credores, mais de 300 ex-empregados de alguma das empresas do grupo de comunicação Organização Arnon de Mello (OAM), os pagamentos foram feitos com deságio de 40%, ou seja: do total da dívida, as empresas impuseram pagar apenas 60% – e parcelados.
Na maioria dos casos, os trabalhadores já haviam feito acordos na Justiça do Trabalho, imediatamente após as demissões, em que aceitaram redução do valor a que tinham direito, originalmente.
Sob a alegação de que não teria condições de pagar nem esse valor, as empresas aplicaram mais um deságio, em pagamentos feitos de 2023 para cá.
Porém, pelo visto, para salvar patrimônios importantes para o sócio majoritário – Collor –, como o controle das empresas e um imóvel, o dinheiro apareceu.
As empresas amaçaram não quitar pagamentos e promover demissão em massa, caso perdesse o sinal da Globo, mas, não explicaram como pagam R$ 67 mil de salários a seu diretor-executivo, Luís Amorim, conforme documento que consta em recurso movido pela própria emissora carioca, para desfazer a sociedade com a tv de Collor.
O trabalhador beneficiado, cuja identidade foi preservada, atuava como técnico em eletrônica, numa das etapas de transmissões de televisão.
Como noticiado pelo blog, o trabalhador tem para receber R$ 371 mil e as cotas sociais de Fernando Collor, sócio majoritário das empresas, convertidas em dinheiro, somam R$ 422 mil.
A defesas jurídica do trabalhador fez ver à Justiça que as cotas sociais, tendo valor econômico, poderiam ser convertidas em pagamento e apontou decisões de vários tribunais que autorizavam esse procedimento, a penhora de cotas sociais, mesmo quando a empresa se encontra em recuperação judicial.
De acordo com os operadores do Direito que atuam na Justiça do Trabalho, o empregado é a parte frágil na relação trabalhista (e nos processos que tramitam nesse ramo do Judiciário), também denominado no jargão jurídico de segmento hipossuficiente, por ter menos condições de defender seus direitos.
A confirmar essa condição do trabalhador, basta ver o tempo em que os processos de credores trabalhistas de Collor vêm se arrastando na Justiça.
Há também a proposta feita pela Organização Arnon de Mello de pagar aos ex-empregados apenas dez salários-mínimos, independentemente da função e do tempo de serviço.
A proposta – considerada absurda, pelo valor tão irrisório – foi feita na assembleia geral de credores (AGC), em 2022, fórum previsto na lei que instituiu a recuperação judicial, uma alternativa à falência para empresas que detêm certo peso em seus mercados.
Na época, o valor era equivalente a R$ 12,5 mil.
O objetivo da legislação é evitar que uma empresa assim, ao chegar à condição de insolvência, siga direto para a falência, levando consigo toda a cadeia de fornecedores e seus postos de trabalho.
Na prática, funciona como uma espécie de blindagem, pois a empresas não pode sofrer várias medidas judiciais.
Mas, no caso das empresas de Collor, além da blindagem – ou exatamente por ela – a recuperação judicial tem também se mostrado uma manobra para dar calote nos credores trabalhistas.
Um dos principais indícios foram os repasses aos sócios, já durante a recuperação judicial, o que é ilegal.
Feitas sob a forma de empréstimos de mútuo (ou seja, sem passar por instituições financeiras), as operações totalizaram R$ 6 milhões.
Collor é o sócio majoritário.
Quitação
A formalização do compromisso de pagar ao credor que tinha conquistado o direito de ser o controlador das empresas – pela penhora das cotas da sociedade – foi oficializada nessa terça-feira (25) e além desse trabalhador, também recebeu outro credor: o que tinha obtido o direito de penhorar outro bem de Collor, a chácara na elegante estância de inverno paulista de Campos do Jordão.
O imóvel foi avaliado em cerca de R$ 10 milhões.
A reportagem apurou que um terceiro credor também foi beneficiado nos mesmos termos – por, igualmente, ter conseguido a penhora de outro bem imóvel de Collor: a cobertura no prédio de luxo na orla de Jatiúca, um dos bairros nobres de Maceió, e de frente para o mar.
O blog procurou informações sobre o valor do crédito desses trabalhadores, mas, sob essa mesma alegação de preservar os credores, obteve apenas a estimativa de que um deles seria na casa dos R$ 300 mil.
Na véspera, outros dois credores, com montantes menores a receber, também obtiveram o direito à quitação do que lhes era devido, igualmente em valores integrais.
Esses credores integram o mesmo grupo cuja defesa acionou um dispositivo legal denominado de incidente de desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ).
O mecanismo consiste, na prática, de cobrar do patrimônio pessoal dos sócios dívidas não honradas por suas empresas.
Na Justiça do Trabalho, o dispositivo pode ser acionado apenas demonstrando que a pessoa jurídica (a empresa) não pode pagar.
Na Justiça comum, onde tramita o processo da recuperação judicial das empresas de Collor, acionar o mecanismo é mais complexo, requer mais elementos.
Um deles é a comprovação de que a empresa pagava diretamente as despesas dos sócios.
Porém, no próprio processo da recuperação judicial, há referência a pagamentos feitos pelas empresas de Collor a prestadores de serviço de limpeza e manutenção de piscina e até com jazigos em cemitério.
Despesas que não têm nada a ver com a atividade fim de um grupo de comunicação.
Neste último caso, os pagamentos eram feitos à empresa que administra o cemitério onde estão enterrados os pais de Collor.
Os pagamentos poderiam ser feitos pela pessoa do sócio, com o que tirasse das empresas, mas, a lei proíbe que as empresas efetuem esses pagamentos diretamente do seu caixa.
Tal irregularidade é definida na lei como confusão patrimonial.
Com base nisso, a defesa dos credores trabalhistas pediu que os processos desse grupo de credores saíssem da recuperação e pudessem voltar para a Justiça do Trabalho, onde obteve essas medidas contra o patrimônio de Collor.