As investigações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre os processos envolvendo a Braskem em Maceió podem estender as apurações sobre a operação que levou o município a pagar R$ 23,5 milhões à Construtora Lima Araújo, por uma área entre os bairros do Canaã e Tabuleiro, que se estende das proximidades da avenida Durval de Góes Monteiro até as da Avenida Menino Marcelo (entre Serraria e Antares).
A operação não foi concluída e o montante deve chegar a R$ 30 milhões.
A relação entre a operação e o trabalho do CNJ (que encerra sua vistoria presencial em Alagoas neste sábado, 20 – mas, deve se debruçar sobre documentos, depois) é que a fonte dos recursos foi o repasse da Braskem, de R$ 1,7 bilhão, feito ao município, em julho do ano passado.
Tanto o motivo do repasse – o município, por meio do prefeito JHC (PL), dar quitação de quaisquer danos que Maceió venha a sofrer – quanto a aplicação dos recursos foram alvo de contestação.
No caso desta área, será para construção de uma via ligando os dois principais corredores de trânsito da região e atravessando o bairro de Santa Lúcia.
A reportagem apurou que, para além da Avenida Menino Marcelo, a via deve se prolongar, em obra posterior, até as imediações do aterro sanitário.
Moradores da Santa Lúcia participaram de audiência pública e questionaram a primeira etapa da obra: a ligação entre as duas principais vias da parte alta de Maceió.
E alguns críticos apontam que seria mais uma das intervenções do poder público para valorizar empreendimentos privados, a exemplo do que foram a avenida Josefa de Mello e a Via Litorânea.
Vale destacar que a futura construção ligando as avenidas Durval de Góes Monteiro e Menino Marcelo passa por outros terrenos pertencentes também à construtora Lima Araújo.
“Fizemos a denúncia, para mostrar essas estranhas ‘coincidências’ em dois processos, envolvendo o município e a construtora”, diz o vereador Joãozinho (PSD), que protocolou documento na Câmara de Maceió denunciando outra operação, também envolvendo o município e a construtora – e ainda mais escabrosa: a permuta de duas ruas na mesma região do bairro de Santa Lúcia.
O integrante da Câmara se refere à apresentação do comprovante do pagamento, pela primeira operação, protagonizada em vídeo publicado em rede social, na companhia do colega da bancada de oposição ao prefeito, vereador Kelmann Vieira (PODEMOS).
Joãozinho esclarece que, das duas operações, apenas a primeira – para aquisição do terreno onde será construída a avenida – utilizou recursos da Braskem.
A segunda, mais complexa, a despeito da aparência de contestável – pela cessão de área pública –, não seria irregular.
Bastava que, para isso, cumprisse as etapas legais: análise – e aprovação – de órgãos técnicos e sendo submetida à igual avaliação pelo Poder que representa o maceioense.
Afinal, na condição de quem está pagando pela operação, com tributos como o IPTU, o cidadão e contribuinte tem todo o direito de ter ciência e aprovar (por meio dos representantes que elegeu) qualquer tipo de transação realizada pelo município.
Trata-se de uma permuta de dez lotes de propriedade da construtora por duas ruas (áreas públicas), também na mesma região da Santa Lúcia.
Acontece que os lotes que a construtora oferece na tal permuta, conforme a denúncia do vereador, uma tremenda de uma compra de “gato por lebre” – como diz o adágio, para ilustrar um mau negócio –, estão numa área de grota.
No fim, esta segunda operação se mostra nada menos que lesiva ao município.
O negócio foi, sim, submetido a órgãos técnicos do município.
Um deles, por exemplo, a Procuradoria Geral do Município, não poupou palavras.
De acordo com o órgão responsável por analisar questões jurídicas que envolvem a Prefeitura, se concluída a operação, a construtora passará a ser detentora de uma área “de valor muito, mas, muito maior que suas atuais posses”, diz seu parecer.
“Desta forma, a procuradora municipal solicitou que a construtora melhorasse sua oferta para a permuta, o que foi negado de pronto pela empresa”, relata documento protocolado pelo vereador na Câmara de Maceió, a quem cabe analisar a operação.
Outro órgão municipal que analisou o pedido da construtora foi a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Territorial e Meio Ambiente (SEDET).
Posição da Coordenadoria de Parcelamento do Solo da SEDET, bem como da Diretoria de Licenciamento Urbano (DLU) também foram contrárias à permuta:
“Acreditamos que existe um déficit do que está sendo solicitado (área plana e no meio das quadras) (…) em virtude do que está sendo ofertado: terreno de fundo de quadra e com uma considerável declividade topográfica, comprometendo a ocupação construtiva, bem como o uso do terreno”.
Também foram consultadas a Secretaria de Infraestrutura e a Secretaria de Educação, porque próximo à área existe uma escola.
Mas, segundo o vereador, as duas operações tão favoráveis à empresa e não tanto para o município – no caso da segunda, lesiva mesmo – não têm nada de coincidência: o dirigente de um dos órgãos municipais, à época, é o engenheiro Pedro Vieira, ex-prefeito-tampão de Maceió.
“A colocação dele [Vieira] no município foi indicação do Jefferson e do João Caldas”, conclui o vereador, referindo-se ao ex-deputado federal e pai do prefeito – que a despeito da discrição, é alguém que atuação intensa na gestão municipal – e de Jefferson Araújo, dono da construtora Lima Araújo.
Mesmo com posicionamento contrário da parte de órgãos técnicos do município, o prefeito JHC encaminhou mensagem à Câmara para obter autorização para fazer a troca.
A reportagem procurou ouvir a Prefeitura, a Construtora Lima Araújo e o ex-secretário Pedro Vieira.
E aguarda retorno.