A Associação dos Empreendedores e Vítimas da Mineração em Maceió enviou uma manifestação ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), na segunda-feira (12), solicitando que o órgão federal vete a venda da parte da Braskem pertencente à Novonor (antiga Odebrecht), que é a maior acionista e controladora da empresa.
A mineração de salgema do subsolo entre a década de 1970 e 2019 foi a responsável pelo afundamento de solo em cinco bairros maceioenses.
A Braskem, que operava essas minas, responde a diversas ações na Justiça de Alagoas e da Holanda pelo prejuízo gerado a mais de 60 mil pessoas, entre moradores e empresários expulsos da hoje zona de exclusão.
O passivo com as vítimas, diz a ação, é estimado em pelo menos R$ 30 bilhões.
A manifestação foi entregue ao Cade dentro do processo que busca a autorização do órgão para venda das ações da Novonor à Petroquímica Verde, uma empresa do fundo de investimento do empresário Nelson Tanure.
Entretanto, a associação cita que, antes de se concretizar a venda, é necessário atender às demandas das vítimas do “maior crime ambiental urbano em curso no mundo”.
Procurada pela coluna, a Novonor informou que não iria comentar a manifestação.
Já a Petroquímica Verde não está comentando sobre as negociações.
O que se alega
Segundo o relatório da associação, as condicionantes impostas pelo Cade para a aprovação do negócio são “manifestamente insuficientes” para proteger “a ordem econômica, a livre concorrência e o interesse público”.
Foram feitas pelo Cade três exigências:
Respeito ao direito de preferência da Petrobras;
Consenso com os bancos credores sobre as garantias
Resoluções do passivo ambiental em Maceió.
A associação afirma que o passivo não se limita a questões ambientais, mas também danos “econômicos, sociais, urbanísticos, cíveis e criminais”.
“[A venda é um] porta aberta para a evasão de responsabilidades”, diz.
Como argumento principal, eles falam dos valores pagos às vítimas.
No caso do acordo coletivo firmado com órgãos públicos em Alagoas, a Braskem aceitou apenas pagar uma quantia fixa de R$ 40 mil por família expulsa de casa (além do dano material pago em valores calculados sobre os imóveis), independentemente da quantidade dos moradores ou de fatores associados.
Para questionar esse valor, a associação usa como parâmetro as metodologias adotadas pela CIDH (Corte Interamericana de Direitos Humanos) e em estudos de instituições como a Organização Cáritas e a FGV (Fundação Getúlio Vargas).
“Tais estudos estabelecem matrizes de danos para casos de remoção forçada, definindo que vítimas diretas devem receber entre U$ 40 mil (R$ 216 mil) e U$ 80 mil (R$ 432 mil)”, diz.
Com base nisso, eles fazem o seguinte cálculo de valores a serem pagos:
Moradores dentro do mapa de risco: R$ 13,95 bilhões para 58.136 pessoas.
Negócios aniquilados: Pelo menos R$ 1 bilhão para 6.181 negócios.
Empresários, trabalhadores e familiares impactados: R$ 15,13 bilhões para 63.046 pessoas.
“O cálculo do dano moral mínimo devido pela Braskem apenas às vítimas diretas”, diz trecho da manifestação enviada ao Cade.
“É imperativo ressaltar, ainda, que esta cifra de R$ 30 bilhões é conservadora”, enfatiza.
“Ela não contabiliza os danos ambientais, os prejuízos à mobilidade urbana, nem a destruição do patrimônio público e do patrimônio histórico material e imaterial”.
Além das vítimas diretamente expulsas de casa, a Braskem é alvo de uma ação da Defensoria Pública do Estado que cobra os prejuízos da desvalorização de 22 mil imóveis no entorno da área.
Nesse caso, é estimado um débito de mais R$ 4 bilhões.
Porque querem o veto
Com base nesses dados, a preocupação levantada na manifestação está na “dimensão real, subdimensionada e ainda irresolvida” do passivo da Braskem.
Para as vítimas, aprovar a venda nessa situação, sem condicionantes estruturais e específicas, criará um “perigoso precedente que premia a conduta ilícita”, introduzindo “risco sistêmico inaceitável no mercado”.
Por fim, o documento ainda cita que a responsabilidade da Braskem está sendo investigada também na esfera criminal.
A PF (Polícia Federal) já concluiu inquérito, indiciando formalmente a empresa 30 vezes, além de apontar indícios contra representantes e autoridades por crimes como poluição qualificada e usurpação de patrimônio da União.
“Nesse contexto, a pressa em alienar o controle acionário da Braskem antes da conclusão da Ação Penal pode (e deve) ser interpretada como uma manobra estratégica para transferir o ativo e diluir a responsabilidade dos atuais controladores (Novonor) e de seus executivos perante uma condenação criminal”, diz outra passagem de manifestação enviada ao Cade.
Uma ação penal também movida pela associação contra Braskem, ANM (Agência Nacional de Mineração), BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e IMA (Instituto do Meio Ambiente de Alagoas), que se encontra no STJ e STF em fase de recurso.
O caso está agora sob análise do MPF (Ministério Público Federal), que vai decidir se faz ou não a denúncia contra a empresa e as pessoas que teriam sido responsáveis.
Carlos Madeiro – Colunista do UOL


