AGU vê infração na concessão da TV de Collor e apoia ação da Globo no STF

Globo diz não poder mais ser sócia de Collor; turma do STJ que decidiu em contrário tem à frente homenageado pela OAM
Prédio da AGU em Brasília, órgão federal que questiona a concessão ser mantida, por considerar que isso se constitui em violação da lei – motivo: Collor ter sido condenado com sentença transitado em julgado (sem ser mais possível recurso; pessoas nessa condição não podem ser detentores de concessão de rádio ou televisão no Brasil); Collor foi condenado a oito anos e dez meses de prisão e está em prisão domiciliar em Maceió. (Foto: reprodução / Rafa Neddermeyer / Agência Brasil; reprodução)

A AGU (Advocacia-Geral da União) encaminhou nesta sexta-feira (12) manifestação ao presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, afirmando que o governo federal tem interesse em participar da ação proposta em que a Globo pede rompimento com a afiliada de Alagoas, a TV Gazeta, de propriedade do ex-presidente Fernando Collor.

A AGU cita na manifestação que o Ministério das Comunicações, responsável pelas outorgas de rádios e TVs pelo país, já abriu processo administrativo para avaliar a legalidade da manutenção da concessão da TV, já que Collor foi condenado pelo STF em maio de 2023 e cumpre pena de oito anos e dez meses de prisão pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção.

“Há indícios claros de infração por parte da entidade afiliada, decorrentes da permanência, em sua estrutura societária e diretiva, de pessoas já condenadas judicialmente, razão pela qual instaurou processo de apuração de infração”.

“Tal situação configura violação às exigências legais de idoneidade para o exercício da atividade de radiodifusão e pode ensejar, inclusive, a penalidade de cassação da outorga”, diz a manifestação.

A manifestação afirma que o Decreto nº 52.795/1963 “considera infração admitir como sócio ou dirigente pessoa condenada, por decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, por crimes listados na Lei Complementar nº 64/1990”.

Além de Collor, o diretor-executivo da OAM (Organização Arnon de Mello), Luís Amorim, também foi condenado na mesma ação penal por lavagem de dinheiro.

Ele segue no cargo de gerência dos veículos de comunicação do ex-presidente mesmo após o trânsito em julgado da decisão do STF (quando não há mais possibilidade de recurso).

A AGU ainda diz que, nesse cenário, há “inequívoca presença de interesse público federal na matéria” e cita que o caso “envolve o cumprimento da legislação de radiodifusão, a regularidade da outorga concedida à TV Gazeta e a idoneidade exigida para a prestação do serviço público”.

O documento da AGU foi assinado por três advogadas:

Isadora Maria Belém Rocha Cartaxo de Arruda, secretária-geral De Contencioso

Lívia Losso Andreatini, coordenadora-geral Jurídica

Entenda a disputa

A Globo entrou com ação no STF no dia 24 de agosto pedindo a suspenção dos efeitos da decisão da 3ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça), em 19 de agosto, que determinou a renovação compulsória do contrato de afiliação entre a Globo e a Gazeta pelo prazo de cinco anos. Barroso é relator do caso.

A decisão do STJ mantém a renovação compulsória imposta pela Justiça de Alagoas, em primeira em segunda instâncias, com a TV Gazeta —empresa de Collor que está em recuperação judicial desde 2019.

Na ação, a Globo cita que o principal motivo para romper a relação de 50 anos é que o proprietário da TV, Fernando Collor, foi condenado por crime de corrupção e lavagem de dinheiro pelo STF.

Para a Globo, a decisão do STJ “viola frontalmente as ordens pública e social, ao comprometer o exercício legítimo da liberdade de programação e expressão por meio da imposição de vínculo com uma afiliada que não mais atende aos padrões éticos, editoriais e reputacionais exigidos pela emissora nacional”.

O contrato de afiliação, portanto, não é apenas um acordo comercial.

Ele é um mecanismo de densificação da liberdade de expressão e de programação, que pressupõe sinergia editorial, confiança institucional e alinhamento ético entre as partes.

“Sem esses elementos, a hipótese é de controle da programação e da liberdade de expressão das emissoras, obrigando-as a associar seus conteúdos a espaços de divulgação contrários a seus padrões éticos e criativos”, diz argumentação da TV Globo.

Na audiência do STJ, o advogado da TV Gazeta, Carlos Gustavo Rodrigues de Matos, alegou que a TV Gazeta foi surpreendida, sem qualquer notificação prévia, pelo fim da parceria.

Ele voltou a dizer que o contrato com a Globo é essencial para a saúde financeira do grupo.

“A empresa investiu R$ 30 milhões em renovação de equipamentos para propagação do sinal da Globo em todo o estado”.

“Somos a maior rede de comunicação de Alagoas, que emprega 400 pessoas; e esse contrato representa 100% da receita da TV Gazeta e 75% de todo o grupo, é composto por mais nove rádios”, disse.

“A situação da expectativa de renovação não era somente de mais um contrato, mas da segunda relação mais longa [da Globo] do país: são 50 anos de uma parceria, de um negócio jurídico em que, durante toda a sua história, não há sequer uma notificação, uma observação quanto à má qualidade da prestação da TV Gazeta”, disse Carlos Gustavo Rodrigues de Matos, advogado da TV Gazeta.

Carlos Madeiro — Colunista do UOL

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