Câmara aprova projeto sob o argumento de “esclarecer” sobre aborto, mas, que movimentos de mulheres veem como tortura

Discussões citam contradição de defensores do direito de fetos também propagarem bordão da extrema-direita sobre pessoas pobres que cometem crimes
Plenário da Câmara de Maceió e páginas de perfil do vereador Leonardo Dias (autor do projeto), representante da direita, ferrenho adversário do aborto, mas, apoiador bolsonarista – segmento que defende cidadãos armados. (Foto: reprodução)

A Câmara de Maceió promulgou proposta de autoria do vereador Leonardo Dias (PL) que, sob o argumento de esclarecer acerca de riscos do aborto e atuar em defesa da vida, na visão de segmentos de mulheres encobre um processo de tortura.

Conforme noticiou o portal Eufemea – Plataforma Informativa, dedicado a noticiar e discutir questões relativas ao segmento “o projeto de lei que prevê a obrigação de todos os estabelecimentos da rede municipal de saúde orientarem mulheres sobre ‘riscos e consequências’ do aborto, conforme previsto em lei, foi promulgado pelo presidente da Câmara de Vereadores, Galba Netto”, cita trecho da reportagem assinada pela jornalista Raíssa França.

Aliás, o próprio processo da promulgação demonstra o quanto o poder público municipal se eximiu da discussão.

O projeto foi discutido, votado e aprovado, no início do ano, seguindo o processo legislativo – pelo qual teve até audiência pública.

Porém, como não houve manifestação do Executivo (a Prefeitura, que tem à frente o prefeito JHC – PL), a legislação estabelece que o Legislativo, responsável pela aprovação da matéria, por sua iniciativa, a transforme o projeto de lei numa lei em vigor.

Daí, em vez de o texto ter sido sancionado (medida que cabe ao Executivo: prefeitos, governadores e à Presidência), ter sido promulgado – medida que cabe ao chefe do Legislativo; no caso de Maceió, o presidente da Câmara Municipal, vereador Galba Netto (MDB).

Em outro trecho, o portal Eufemea cita:

“Na época em que o projeto foi protocolado, a vereadora Olívia Tenório convocou uma audiência pública para debater a revitimização da mulher que opta pelo aborto, conforme previsto em lei”, diz a reportagem da jornalista Raíssa França.

“Ainda na época, para especialistas ouvidas pelo Eufêmea, o projeto era inconstitucional e poderia ser comparado a ‘tortura’ para meninas e mulheres”, acrescenta a reportagem.

O motivo para a discussão é a forma como se daria esse “esclarecimento”, supostamente envolvendo imagens fortes e repulsivas, em vez de formas diferentes de abordagem.

Em outras palavras: apresentar apenas uma versão do tema.

Outro questionamento de críticos da proposta está na contradição de segmentos da direita que, ao mesmo tempo em que defendem o “direito à vida que têm os fetos indefesos”, propagam um dos bordões dessa linha ideológica: do “bandido bom é bandido morto”.

Em seu perfil em rede social, o vereador Leonardo Dias apresenta outras propostas para acolhimento de mulheres em vulnerabilidade social – e gestantes –, como a criação de uma bolsa enxoval e a destinação de espaço diferenciado em hospitais para mulheres desse segmento social que sofreram abortos espontâneos.

Mas, como citou uma das mulheres críticas à iniciativa e à abordagem do tema via “tortura” psicológica: “que de pró vida não tem nada, porque quando esse feto se torna uma criança, eles esquecem da valorização da vida deixando-os à margem da sociedade, e se por um acaso ele cometem um crime, o discurso ‘bandido bom é bandido morto’ tá na ponta da língua”.

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